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A Alegria | Crítica

Fábula apichatponguiana põe na rua o bloco das lendas e dos idealistas

18.08.2011, às 19H00.
Atualizada em 25.11.2016, ÀS 05H06

O agradecimento a Apichatpong Weerasethakul no final de A Alegria diz muito sobre o filme de Marina Méliande e Felipe Bragança, selecionado para a Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes ano passado. O cineasta tailandês, ademais, é referência central para a geração de cineastas, cinéfilos e críticos que saiu da Universidade Federal Fluminense nos anos 2000, da qual Marina e Bragança fazem parte.

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Mas o Rio de Janeiro não é a Tailândia. Se nos filmes de Apichatpong uma memória folclórica e a espiritualidade permeiam a rotina moderna, é porque nunca se separaram de verdade. Já na capital fluminense, a partir de sua geografia, o que se opera não é uma permuta, mas uma substituição - a natureza deu e continua dando lugar à cidade e suas brutalidades.

A Alegria começa com essa disputa já em seu primeiro plano, com antenas de rádio cortando o enquadramento de baixo pra cima, como se o céu rachasse. A grosso modo, acompanhamos a reação de Luiza (Tainá Medina), de 16 anos, ao saber que seu primo foi baleado em Queimados, na Baixada. Em tom de fábula, o filme trata da resposta da natureza à violência, e é Luiza quem canaliza esse revide.

Natureza e violência surgem aqui no sentido mais amplo das palavras. O "mundo natural" de A Alegria envolve desde o encantamento com o prosaico (tênis molhados no chão depois de um banho na fonte) à redescoberta das coisas (ao cachorro que não tem nome, Luiza e seus amigos dão o nome de "cachorro"). Já a violência surge implícita nos seus reflexos: o medo, a fuga. Toda violência em A Alegria quando não é cartunesca (o embate com a polícia) já chega consumada (o braço engessado da amiga).

Visualmente, há mais violência em A Alegria no destrinchar de uma jaca - de novo, uma situação do mundo natural - do que propriamente nas cenas de morte. É como se o pavor existisse hoje no Rio de Janeiro sem precisar da violência em si, e diante de uma condição patética dessas só resta a galhofa. Se Apichatpong tem os homens-tigres e os homens-macacos, A Alegria vai de fantasias folclóricas e máscaras de Carnaval, uma adaptação bem humorada da ideia de trazer o ancestral para o agora, o sobrenatural para o natural.

Obviamente, dá pra argumentar que a violência no Rio de Janeiro não é motivo de piada, que o medo é justificado etc. Marina e Bragança não negam essa evidência; ela apenas não se encaixa na paisagem naïf de A Alegria. O filme prefere a disposição desarmada dos adolescentes mais idealistas - e consequentemente incorre nos exageros de discurso e na pose desses idealistas. Há uma certa autossuficiência em A Alegria que não faz bem ao filme, mas Bragança, que gosta de dizer que faz cinema na base do erro, abraça suas escolhas com honestidade. O destemor de encarar a vida que o filme prega se aplica também ao jeito de filmar.

A Alegria | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Bom
A Alegria
A Alegria
A Alegria
A Alegria

Ano: 2010

País: Brasil

Classificação: 14 anos

Duração: 100 min

Direção: Felipe Bragança, Marina Meliande

Elenco: Clara Barbieri, César Cardadeiro, Sandro Mattos, Tainá Medina, Rikle Miranda, Junior Moura

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