O diretor Rodrigo García já havia demonstrado em filmes como Nove Vidas (2005) e Coisas que Você Pode Dizer Só de Olhar Para Ela (2000) sua predileção por retratar nas telas o universo feminino. Em Destinos Ligados (Mother and Child, 2009) esta temática não é diferente. Mas este não é, de maneira alguma, um filme de exaltação de feminilidade e feminices. Não há príncipes encantados, glamour, compras ou drinques.
Destinos Ligados conta a história de três mulheres cujas vidas se encontram - como já adianta o título brasileiro - em torno de um mesmo tema: maternidade e adoção. Karen (Annette Bening) é uma profissional da saúde que engravidou aos 14 anos, mas entregou seu bebê para a adoção e mesmo depois de tantos anos não superou totalmente essa escolha. Ela é fria e ríspida com todos a sua volta, mesmo quando em seu interior gostaria de ser amável. Karen sente dificuldade de demonstrar afeto e, quando percebe, já soltou sua habitual resposta curta e grossa, até com o homem de seu interesse.
Destinos Ligados
Destinos Ligados
Destinos Ligados
Elizabeth (Naomi Watts) é a filha de Karen, que cresceu com pais adotivos, mas já aos 17 anos desligou-se deles e optou por viver sozinha e construir sua vida. Hoje ela é uma advogada de sucesso que não cultiva relações afetivas ou ligações emocionais. Esta frieza é demonstrada claramente na cena de sexo entre ela e o personagem de Samuel L. Jackson, seu chefe na firma de advocacia. Vemos ali um sexo higienizado e vestido, sem erotismo, meramente funcional e sem floreios - as únicas peças de roupa removidas são aquelas que obstruem as partes do corpo diretamente utilizadas no ato.
A última das protagonistas é Lucy (Kerry Washington), uma mulher casada que não consegue engravidar, então decide adotar uma criança. Entre conversas com o marido e com a freira responsável pelas adoções, Lucy encontra seu bebê, ainda na barriga de Ray (Shareeka Epps), exigente moça de 20 anos que já havia rejeitado dois casais para seu filho. É na dinâmica entre Ray e Lucy que vemos o outro lado da maternidade, que se estabelece como uma relação de poder. O corpo apto, funcionante e fecundo versus o carinho e afeto maternal, que não corresponde aos ovários inférteis. Esta relação de poder também se evidencia na cena entre Elizabeth e a ginecologista (Amy Brenneman) e na relação de Karen e a filha da faxineira mexicana.
Falar mais sobre a trama aqui seria revelá-la por inteiro, pois o mais interessante da história - contada em ritmo lento e, para aqueles que não se identificam com a temática, enfadonho - é a maneira como a vida das personagens se cruzam. As ótimas atuações são o principal mérito do longa. Pouco se verbaliza, mas o trabalho interno de ator é evidenciado pela angústia dos personagens - quase todos têm um assunto mal resolvido entalado na garganta.
No entanto, ao fim da película, foi inevitável lembrar as palavras do aclamado escritor português António Lobo Antunes na FLIP de 2009. Aos 67 anos, o autor falava de seus primeiros livros e a vaidade de sua juventude, quando tentava demonstrar quão inteligente era em pequenas metáforas e construções textuais. Para Lobo Antunes, depois de muito chão percorrido nas letras, um livro não deve ser pontuado por várias metáforazinhas afetando inteligência, mas sim o livro inteiro deve ser uma só metáfora. Isso pode ser aplicado a Destinos Ligados, que ao longo do percurso entrega momentos sensíveis e profundos, mas deixa o espectador sair da sala de cinema intocado.
Saiba onde Destinos Ligados está passando
Ano: 2009
País: EUA, Espanha
Classificação: 14 anos
Duração: 125 min
Direção: Rodrigo García
Roteiro: Rodrigo García
Elenco: Naomi Watts, Samuel L. Jackson, Annette Bening, Carla Gallo, Kerry Washington, David Morse, Amy Brenneman, Britt Robertson, Marc Blucas, Tatyana Ali, Jimmy Smits, Cherry Jones, S. Epatha Merkerson, Elpidia Carrillo, Lisa Gay Hamilton, Eileen Ryan, David Ramsey, Ahmed Best, LaTanya Richardson, Shareeka Epps, Gloria Garayua