Assim como os dinamarqueses (pelo menos os que vemos no cinema), que falam o que pensam sem se importar com mal-entendidos, Uma Família (En Familie, 2010) a princípio parece que está nos testando.
O filme da diretora Pernille Fischer Christensen (Além do Desejo) começa com um jovem casal dinamarquês, ele artista plástico e ela dona de galeria, recebendo uma proposta de emprego em Nova York. A seguir, os créditos iniciais narram a história da família da moça, três gerações de padeiros que hoje fornecem o café-da-manhã da família real da Dinamarca.
uma família
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Pronto, está montado o cenário para um conflito de gerações, os velhos padeiros e os jovens artistas, artesanal versus industrial, família versus individualismo. Mas não é só. A personagem no centro da trama, Ditte (Lene Maria Christensen), de repente engravida. E Uma Família, que com cinco minutos já estava plenamente manjado, adiciona mais um dilema à massa: além de escolher entre a Dinamarca e Nova York, entre o passado e o futuro, enfim, Ditte terá que optar entre a carreira e a maternidade.
Mas espere. Tomadas essas decisões, logo vem outra questão. O pai de Ditte, Rikard (Jesper Christensen, de Cassino Royale), o velho dono da padaria, descobre que retornou o seu câncer. Se Ditte já parecia ver resolvidos seus embates 8 ou 80, voltamos à estaca zero com mais um. Sempre cabe mais um. Uma Família é aquele tipo de filme em que tudo está sempre à beira de ruir, e o espectador que não esperar na defensiva será carregado junto.
Mesmo para os padrões do cinema dinamarquês pós-Dogma 95, acostumado aos melodramas sem meias palavras, Uma Família é um teste de resistência. Pernille Fischer não tem o talento de sua compatriota mais célebre Susanne Bier, ambas não são muito chegadas numa sutileza, mas eventualmente Uma Família recompensa os mais resistentes (ou os teimosos). Quando a discussão pesada de temas delicados assenta, o filme se encontra.
No fim, não trata-se de uma obra para condenar ou defender o aborto, para louvar a tradição ou a mudança, mas para refletir sobre a morte. Tudo acaba um dia, como dizem, seja um feto mal formado ou uma marca centenária. O tempo que Uma Família reserva para os seus lutos pessoais, para toda a cerimônia que envolve o pesar íntimo e coletivo, deixa claro que o importante não é a decisão a tomar, e sim encarar com seriedade e respeito esse momento da escolha.
Ano: 2010
País: Dinamarca
Classificação: 16 anos
Duração: 100 min
Direção: Pernille Fischer Christensen
Roteiro: Kim Fupz Aakeson, Pernille Fischer Christensen
Elenco: Lene Maria Christensen, Jesper Christensen, Pilou Asbæk