Um Jesse Plemons excelente não consegue esconder quão raso é Sorte de Quem?

Créditos da imagem: Cena de Sorte de Quem? (Reprodução)

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Crítica

Um Jesse Plemons excelente não consegue esconder quão raso é Sorte de Quem?

Thriller da Netflix quer ser comentário social, mas não quer trabalhar para isso

Omelete
3 min de leitura
21.03.2022, às 15H56.

O verdadeiro clímax de Sorte de Quem? acontece um pouco antes do esperado. Por volta dos 20 minutos antes do fim do suspense da Netflix, o bilionário interpretado por Jesse Plemons se cansa dos joguinhos do homem que invadiu sua casa (Jason Segel) e vem fazendo ele e sua esposa (Lily Collins) de reféns e resolve confrontá-lo. É quando o filme desenrola seu texto, sua tese principal, e também quando mostra o quão pouco refletido realmente é.

O roteiro é assinado por Justin Lader, colaborador usual do diretor Charlie McDowell (Complicações do Amor, A Descoberta), ao lado do veterano do thriller cinematográfico Andrew Kevin Walker (Se7en). Confinado a um cenário e limitado a três personagens principais, Sorte de Quem? claramente se entende como um daqueles textos de reflexão social, uma peça dramática verborrágica que examina privilégios e conflitos de classe, gênero e raça sob o verniz finíssimo da história de gênero.

O problema é justamente esse, no entanto: o filme já se entende dessa forma desde o começo, pela própria premissa que coloca à frente e pelos personagens que cria para povoá-la. Lader, Walker e McDowell (e inclusive Jason Segel, que recebe crédito pela criação da história) não parecem ter julgado necessário fazer o trabalho para apresentar qualquer insight relevante sobre os temas em que esbarram. Sorte de Quem? é um filme feito a partir do ponto de vista condescendente de quem já acredita saber tudo sobre o que quer falar.

Como resultado, ele apresenta uma versão unidimensional e monocromática de um conflito multifacetado, multicolorido e, acima de qualquer coisa, frequentemente mal compreendido em suas origens e causas. Sorte de Quem? é uma história sobre o absurdo da existência de bilionários, a natureza inerentemente abusiva de uma acumulação de capital dessa ordem, os caracteres identitários que definem até quem é capaz de chegar lá… mas não se preocupa em interrogar o sistema que define e cerca tudo isso. Em sua personalização extrema, seu intimismo insistente, ele ignora propositalmente o quadro maior, porque é muito mais desconfortável de pintar.

Um ponto fora da curva nessa construção é Jesse Plemons. Recém-saído de sua primeira indicação ao Oscar, por Ataque dos Cães, o ator faz aqui um exercício de caricatura brutalmente eficiente. O seu personagem (creditado apenas como “CEO”) é uma coleção de tiques refinados ao ponto da sátira, preenchido com uma raiva e uma frustração desmesuradas que, quando chegam à superfície, expõem o rosto mais feio e mesquinho do privilégio e da meritocracia.

A excelência do ator, especialmente diante de Segel e Collins (que nunca parecem entrar na chave maníaca do seu colega de cena), faz com que alguns dos golpes retóricos de Sorte de Quem? sejam eficazes. E, na direção, McDowell reitera com elegância o detalhismo e ascetismo que já havia abraçado em seus filmes anteriores, homenageando suspenses da era de ouro de Hollywood e fazendo uso engenhoso de rimas visuais que realçam a perturbação da ordem representada pelo personagem de Segel.

Mas, como citei lá no começo do texto, o clímax de toda essa construção vem prematuro, e o filme escancara sua superficialidade logo no finalzinho. Assim, o que deixa para trás mesmo é aquele gosto amargo de oportunidade perdida.

Nota do Crítico
Regular
Sorte de Quem?
Windfall
Sorte de Quem?
Windfall

Ano: 2022

País: EUA

Duração: 92 min

Direção: Charlie McDowell

Roteiro: Justin Lader, Andrew Kevin Walker

Elenco: Jason Segel, Jesse Plemons, Lily Collins

Onde assistir:
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