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Crítica

Sudoeste | Crítica

O tempo e o vento

18.10.2012, às 18H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 14H29

Sudoeste é um filme horizontal. Seu formato de tela, 3,66:1, ainda mais espichado do que o Scope, causa tanto impacto quanto a fotografia em preto e branco. No plano inicial, acompanhamos uma carroça atravessar o comprido quadro, da esquerda para a direita. A câmera se posiciona pouco acima do solo, atrás de galhos secos. Na sobreposição de camadas (a carroça ao fundo e os galhos à frente), é como se a paisagem quebradiça provocasse a lentidão da ação.

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Formado em cinema pela Universidade Federal Fluminense em 1995, Eduardo Nunes levou mais de dez anos para realizar este seu longa de estreia, e a principal influência do diretor, confessa em entrevistas, fica evidente em Sudoeste: Andrei Tarkovsky. O cineasta russo, que discutiu suas ideias e criações no livro Esculpir o Tempo, é a principal referência de diretores como Béla Tarr, que trabalham com a passagem do tempo impressa em imagens na tela. É um exercício que pontua Sudoeste até o fim.

O tempo, afinal, é o protagonista da trama, que transcorre durante um dia em uma vila do litoral. A carroça do início carrega, pela manhã, uma grávida para uma pousada. Só o bebê sobrevive - uma menina, a quem dão o nome de Clarice. Ao longo do filme, acompanhamos Clarice crescer, da adolescência à vida adulta, enquanto a realidade ao seu redor continua vivendo aquele único dia, em que uma grávida morreu durante o parto.

O vento dá o tom do realismo fantástico, como se o tempo estivesse mesmo passando mais depressa do que as coisas sólidas daquele mundo pudessem notar. Um momento em particular parece filmado em time lapse, quando um homem conduz Clarice pela mão lentamente, mas o vento balança tão forte as flores ao chão (de novo a câmera enquadra a paisagem à frente e a ação ao fundo) que soa como efeito visual.

De efeitos Sudoeste está cheio, ademais, embora tenha essa estética naturalista. Os efeitos de som são os mais ostensivos. O barulho do moinho (uma das muitas marcas visuais de passagem de tempo no filme, como as conchas e o trabalho dos rodos na salina) é tão saliente no começo que dá a impressão de ecoar ao longo do filme.

É o tipo de coisa que torna Sudoeste eficiente em matéria de impacto. Não por acaso Eduardo Nunes tem sido comparado com Luiz Fernando Carvalho, cuja estreia no cinema com Lavoura Arcaica foi também um manifesto barroco, um filme que grita suas opções estéticas sem muitos meios termos. Dá pra notar, em comum nesses dois filmes, uma "assinatura" de autor - e aí sempre existe o risco de perder o foco em meio ao autorismo, a assinatura pode virar um autógrafo.

Em Sudoeste, a fotografia de Mauro Pinheiro Jr. (que no set em Pontal do Massambaba trabalha com uma exposição à luz comparável com a de Cinema, Aspirinas e Urubus) dá conta desse desejo de Nunes de "esculpir o tempo" como Tarkovsky, mas fazer travelings laterais constantes em paredes cruas - onde a passagem do tempo obviamente pode ser sentida - não basta para contar uma história. Sudoeste às vezes se perde nesse anseio de estetizar todo e qualquer instante.

Ao fim, fica a certeza de que Nunes tem um olhar a ser depurado. Isso fica claro no melhor plano de Sudoeste, que não tem paredes descascadas ou o vento descabelando pessoas. É um plano aparentemente banal mas que traz informações cruciais sobre os personagens, quando Clarice tem a principal revelação do filme e a câmera recua, fica atrás dela, para mostrar uma estante de garrafas no fundo do bar. Aquelas garrafas não estão ali por capricho, elas têm algo a dizer.

Sudoeste é um filme que tem muito a dizer, mas o maldito barulho do moinho nem sempre deixa a gente escutar.

Sudoeste | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Bom
Sudoeste
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Ano: 2011

País: Brasil

Classificação: 14 anos

Duração: 128 min

Direção: Eduardo Nunes

Onde assistir:
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