Nem o frio, nem o preço alto afastaram o público do CPF2. Foram 5 mil pessoas no primeiro dia e 8 mil no segundo.
Veja GALERIA DE FOTOSFrio é a palavra chave quando se fala da segunda edição do Curitiba Pop Festival (CPF), que rolou na capital paranaense no último fim de semana. Entre músicos, público, jornalistas e produção, não há quem não tenha congelado os ossos para acompanhar a maratona musical.
Por um gelado fim de semana, Curitiba se transformou no alvo de viagens e olhares. Virou quase uma Meca rocker. Era comum se sentir praticamente em casa, encontrando rostos conhecidos, como se os shows estivessem acontecendo no quintal da avó - seja ela de Porto Alegre, São Paulo ou Recife.
A segunda edição do CPF teve um começo atribulado. Há alguns meses, quando o anúncio do único show dos recém-reformados Pixies na América Latina veio à tona, os 3 mil ingressos disponíveis evaporaram rapidamente. A grande procura fez a produção do evento mudar o local: da Ópera de Arame, que abrigou a primeira versão em 2003, para a vizinha Pedreira Paulo Leminski, abrindo espaço para mais 5 mil pessoas.
Se a mudança para a Pedreira fez perder o ar de inocência do primeiro ano, transformando um evento quase intimista em um show de grande porte, o mérito do novo local foi provado rapidamente, aos primeiros acordes. A Pedreira, com seu visual esculpido, é talvez um dos melhores e mais bonitos lugares no país para um show de arena. Perto dela, São Paulo deveria se envergonhar com seus estádios de futebol sem acústica.
Problemas de organização corriqueiros não faltaram, como nos procedimentos para entrada e as filas para quem pretendia se alimentar, mas nada que tumultuasse o evento. As polêmicas e desnecessárias grades do apartheid, que dividiam o público que comprou o primeiro lote de ingressos do restante, não duraram muito. No primeiro dia, ao meio do show do Teenage Fanclub, elas já estavam no chão. No segundo dia, com a ajuda da organização, que preparou grades mais frágeis, o público estava todo unido já no começo da noite.
Apesar do frio, que parecia ser ainda maior devido ao local úmido e descoberto, o CPF2 provou seu potencial e marcou nome no calendário musical brasileiro. Com sua segunda edição, já é um dos principais festivais a olhar a produção independente com o devido respeito.
Volume no talo, qualidade flutuante
O grande ponto positivo do festival foi a qualidade técnica e sonora. De fora do palco, pouco se percebia de algum defeito na qualidade de estrutura disponível às bandas. O maior problema ficou mesmo atrelado à escalação de bandas. A fórmula do festival - que repetiu a aposta em uma banda internacional gigante, duas bandas menores e nomes independentes nacionais preenchendo o lineup - é excelente, mas precisa de um pouco mais de cuidado e atenção.
Mesmo com o sistema de som ótimo, algumas bandas viram sua música se perder no gigantesco ambiente. Caso da recifense Mombojó, que faz um show excelente em ambientes menores, mas teve sua presença diminuída na Pedreira. O mesmo aconteceu com o Teenage Fanclub, cujas canções são repletas de pequenos detalhes que simplesmente desapareceram.
A banda local Íris, além de estar erradamente encaixada entre o rock do Pipodélica e os beats do Sonic Jr., fez praticamente um não-show: o que teria até potencial para músicas interessantes acabou soando como pura pretensão chata.
Bandas desinteressantes e pentelhas também fizeram parte do lineup. Pelebrói Não Sei, que diz primar pela diversão punk, se divertiu sozinha, estando um bocado deslocada no palco. O mesmo deslocamento atingiu a tão proclamada reunião dos Pin Ups, última banda a tocar antes dos Pixies. Os paulistas vieram e se foram sem marcar presença. Melhor seria que tivessem dado mais tempo ao histórico e curto encontro do róque gaúcho de Flu, Wander Wildner e Frank Jorge.
Os mais POP do CPF2
por Eduardo Viveiros e Matheus Pacheco
Pipodélica
A banda independente mais queridinha de Florianópolis, com quatro anos de estrada, já está calejada em fazer shows cada vez melhores. Apesar da falta de energia do bizarro apresentador do primeiro dia, o Pipodélica foi o primeiro nome a realmente empolgar o público na sexta-feira. Em alguns momentos, seu rock psicodélico e distorcido parece reler Secos e Molhados. |
Ludov
Donos de uma qualidade comprovada e de carisma irresistível - boa parte atribuído à vocalista Vanessa Krongold (foto) - a banda paulistana acertou em cheio o público de Curitiba com suas composições pop. Ainda pouco conhecidos fora do mundinho dos fãs, o Ludov tem um EP lançado (Dois a rodar) e se prepara para gravar seu primeiro CD. |
Grenade
Expoentes de Londrina, com um CD recém-lançado, os integrantes do Grenade tiveram seu ótimo show praticamente anulado. Num horário ingrato, no meio da tarde, tocaram seu rock para um público ínfimo. Definitivamente mereciam destino melhor. |
Sonic Jr.
A dupla de Alagoas, com suas interpretações de regionalidade com música eletrônica e guitarra, talvez seja o nome mais destoante de toda a escalação do festival, que prima pelo rock. Mesmo assim, por incrível que pareça, Aldo e Juninho agradaram ao público que estava ali pelos escoceses do Teenage Fanclub. |
Autoramas
Os cariocas subiram ao palco com uma confiança absurda e conquistaram a platéia com sua mistura de Jovem Guarda com uma Surf Music meio Dick Dale. Posers ao extremo, mandaram às favas a tradicional postura ninguém me ama dos indies e deram um anoitecer mais saboroso à Pedreira Paulo Leminski. |
Wander Wildner, Frank Jorge e Flu
Os três mais inventivos representantes das grandes bandas da era de ouro do rock gaúcho (respectivamente Replicantes, Cascavelletes e DeFalla) foram uma das melhores surpresas do festival. Com a confiança e a tarimba de quem não tem mais nada a provar a ninguém, mostraram que, ao contrário da ampla maioria da produção independente nacional, suas composições migram com facilidade do underground escuro e esfumaçado para as grandes arenas. Músicas como Menstruada, Hippie punk rajneesh, Eu, Lugar do caralho e a apoteótica Surfista calhorda levantaram a galera e deram prova que não precisa ser tristonho para ser independente, original e de qualidade. |
Hell on Wheels
De onde diabos vieram eles?, era a pergunta mais recorrente quando se falava da terceira e menor atração internacional do festival. Isso não impediu, porém, que o público se divertisse com a música do trio sueco, que aposta num indie rock melódico e um bocado sujo. A banda também se entusiasmou: no final do show, quando a temperatura local devia beirar os 10° C, o vocalista Rickard Lindgren já estava até sem camisa, atitude imitada por alguns mais empolgados da platéia. Os brasileiros, agora, devem estar amargando uma gripe. Já os suecos, no dia seguinte, disseram a este cozinheiro: estamos achando divertidíssimo que vocês estejam congelando, isso aqui pra gente é verão. |
Teenage Fanclub
Na noite de sexta-feira, os precursores do fofismo no rock mundial estraçalharam os corações presentes na Pedreira. Proporcionando um turbilhão de sentimentos e arrancando até lágrimas da platéia, Sparkys dream, Verissimilitude, Metal baby, Neil Jung, Everything flows e a espetacular The concept foram alguns dos petardos que os simpatissíssimos membros do TFC executaram no palco, com precisão cirúrgica e tesão avassalador. Foi uma apresentação que, além da extrema competência técnica, contou com um componente que a jogou para o topo de qualquer lista dos melhores do festival: a diversão (tanto para o público quanto para a própria banda). |
Pixies
A banda mais esperada da noite (e do ano) adentrou o palco em clima de jogo ganho e, como Romários do rock, não se concentraram muito em sorrisos e simpatia, dedicando-se ao que estavam ali para fazer: rocknroll. E como o fizeram bem! Sem chorumela alguma entre as músicas, eles despejaram um balde de boa música sobre a platéia, que limitava-se a delirar e ovacionar os obesos Frank Black e Kim Deal (foto). A dupla, junto com Joey Santiago e David Lovering, foi tecnicamente perfeita e saciou a carência de 10 anos da platéia com impressionantes 28 músicas em uma hora e vinte minutos de show. E dá-lhe competência. Se foi frustrante a falta de comunicação da banda com o público, parece que bastou ao pessoal pular, dançar e gritar muito - um espetáculo à parte foi ver as pessoas dançando como se estivessem sozinhas em casa durante uma orgástica Here comes your man. |