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007 - Cassino Royale: Entrevista com o desenhista de produção

007 - Cassino Royale: Entrevista com o desenhista de produção

14.12.2006, às 00H00.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H23

007 - Cassino Royale

Casino Royale

EUA/Reino Unido, 2006
Ação/Drama - 144 min.

Direção: Martin Campbell
Roteiro: Neal Purvis e Robert Wade, baseado em livro de Ian Fleming

Elenco: Daniel Craig, Eva Green, Mads Mikkelsen, Judi Dench, Jeffrey Wright, Giancarlo Giannini, Caterina Murino, Simon Abkarian, Isaach De Bankolé, Jesper Christensen, Ivana Milicevic, Tobias Menzies, Claudio Santamaria, Sebastien Foucan, Malcolm Sinclair, Richard Sammel, Ludger Pistor


O desenhista de produção Peter Lamont é parte do legado Bond há mais de quatro décadas. Seu primeiro filme na série foi 007 Contra Goldfinger (Goldfinger), de 1964, e 007 - Cassino Royale é seu 18o filme de James Bond - um recorde impressionante.

Tem sido fantástico, afirma Lamont. E, obviamente, trabalhar nos filmes de Bond tem sido uma parte importante da minha vida. Eu trabalhei em 18 dos 21 filmes, o que foi um enorme prazer. Eles são muito divertidos e parece que formamos uma grande família.

Lamont só perdeu três filmes de Bond no total - os dois primeiros, 007 Contra o Satânico Dr. No (Dr. No) e 007 - Moscou Contra 007 (From Russia With Love) foram produzidos antes que ele entrasse para a equipe, e ele não integrou a equipe de 007 O Amanhã Nunca Morre (Tomorrow Never Dies), porque já estava comprometido com um outro filme.

Sim, eu estava naquele navio que foi a pique, brinca ele, referindo-se a Titanic, um dos filmes de maior sucesso de todos os tempos e que lhe deu um Oscar de Melhor Direção de Arte. Lamont também foi indicado à estatueta da Academia em três outras ocasiões, inclusive com 007 - O Espião Que Me Amava (The Spy Who Loved Me), de 1977.

O desenhista de produção de 77 anos possui vasta experiência e um grande repertório de histórias de filmes de James Bond, que incluem o trabalho com todos os atores que já interpretaram o agente 007 - de Sean Connery ao atual, Daniel Craig.

Eu acho Daniel uma ótima escolha, afirma ele. Nós estávamos todos aqui quando ele fez os testes e nosso voto foi para ele que foi, de longe, o melhor. Ele se movimenta bem, é um ótimo ator, é muito bonito e habilidoso fisicamente -- todos os grandes atributos para um James Bond. Nós ficamos todos muito empolgados quando ele teve essa chance.

Lamont começou sua carreira na década de 50 como desenhista técnico, trabalhando no departamento de arte de filmes britânicos como The Importance of Being Earnest, A Day To Rememver e Miracle In Soho.

Ele foi recrutado para a família Bond pelo então desenhista de produção Ken Adam e incumbido do tipo de desafio que ele claramente aprecia - desenhar a fachada exterior de Fort Knox, que seria então construída nos estúdios Pinewood.

Lamont relembra que seu set foi alagado pelo diretor Guy Hamilton e pelos lendários e já falecidos produtores de Bond, Cubby Broccoli e Harry Saltzman, e que ele temia ser riscado da produção por seus projetos absurdamente extravagantes e, obviamente, de custos exorbitantes.

Eu quase caí para trás, porque o orçamento foi de £ 56.000 libras esterlinas, o set mais caro que já havia sido projetado até então. Eu pensei, ‘Ai, meu Deus, vou ser demitido por conta disso’.

Mas ninguém ligou a mínima. Guy disse: ‘Ora, elimine este pedaço e aquele, vamos fazer isso e aquilo…’ e o orçamento caiu para £ 40.000 libras, e então eles disseram, ‘Tudo certo, podem construir!’ E nós fizemos o paisagismo do local e construímos a rua de concreto de Black Park, nos estúdios de Pinewood. Foi incrível.

Alguns dos desafios de 007 - Cassino Royale incluíram achar as edificações ideais para o Hotel Splendide e para o próprio cassino, que Lamont acabou por encontrar na histórica cidade-spa de Karlovy Vary, na República Tcheca.

Um prédio bastante dilapidado chamado Lazne I foi remodelado por Lamont e sua equipe antes do início das filmagens. Mas, ao final, ele demonstrou ser a locação perfeita.

Infelizmente, Lazne estava em péssimo estado, mas com um pouco de atenção, carinho, a ajuda do grupo de preservação local, e mais o nosso dinheiro, eu acho que nós o restauramos à sua condição original. Quando terminamos nosso trabalho, ele ficou lindo.

Quantos filmes de James Bond o senhor já fez?

18 dos 21. Nem todos como desenhista de produção. Eu comecei como desenhista de produção em 007 Somente Para Seus Olhos (For Your Eyes Only) e não participei de 007 O Amanhã Nunca Morre (Tomorrow Never Dies) porque eu estava naquele transatlântico que foi a pique na época (Titanic). Eu comecei como um dos desenhistas técnicos de Ken Adam (desenhista de produção) em 007 Contra Goldfinger (Goldfinger), então perdi os 2 primeiros e também 007 O Amanhã Nunca Morre (Tomorrow Never Dies).

Como foi trabalhar com Sean Connery?

Ótimo, ele é 100% profissional. E Roger (Moore) era um homem maravilhoso, muito concentrado e sempre sabia de cor todas as suas falas. Ele conhecia todo mundo e adorava uma boa piada e brincava com todos. Um homem maravilhoso.

E agora o senhor trabalhaou com o novo Bond, Daniel Craig.

Eu acho Daniel uma ótima escolha. Nós estávamos todos aqui quando ele fez os testes e nosso voto foi para ele que foi, de longe, o melhor. Ele se movimenta bem, é um ótimo ator, é muito bonito e habilidoso fisicamente -- todos os grandes atributos para um James Bond. Nós ficamos todos muito empolgados quando ele teve essa chance.

O senhor acha que Daniel está mais próximo da versão original de Bond criada por Fleming?

Não sei. Eu acho que Terence Young, diretor de 007 Contra o Satânico Dr. No (Dr. No) e 007 Contra a Chantagem Atômica (Thunderball) foi quem pôs tudo no mapa através do modo como ele visualizou Bond - o modo como ele se vestia, a pasta, tudo aquilo - e tudo se originou dali. Se você assistir àqueles primeiros filmes de Bond, ele é realmente um pouco esnobe, sabe - os carros que ele dirige, o cigarro que ele fuma, suas camisas feitas à mão. E acho que era assim que Terence o via. Mas muita coisa mudou deste então e agora estamos no mundo real. Mas Terence definitivamente estabeleceu um padrão com Dr. No.

Como é o início do processo de produção de um filme de James Bond para o senhor?

Bem, com 007 - Cassino Royale, nós fizemos muita pesquisa, viajamos muito, tentando decidir o local onde iríamos filmar antes da chegada de Martin (Campbell, diretor). E devo dizer que, depois que Martin foi confirmado a bordo como diretor, foi ótimo, porque já tínhamos trabalhado com ele em 007 Contra GoldenEye (GoldenEye) e sabíamos que era uma ótima escolha. Ele havia posto os filmes de Bond de volta ao mapa (com GoldenEye) e o filme só ganhou contando com a direção dele.

Qual é a abordagem visual deste filme?

Bem, de várias maneiras, tentamos mantê-lo o mais fiel possível ao livro. Então, tivemos de decidir onde estariam localizados o Hotel Splendide e o Cassino Royale. No livro de Fleming, eles estão localizados no sul da França. E começamos a pensar em vários locais para eles, procuramos para todo lado - fomos à Croácia, à Itália e à Espanha. Mas quando fomos à Praga, eu sugeri que procurássemos fora da cidade, em Karlovy Vary, porque eu achava que teria mais a oferecer e ainda não era uma cidade tão conhecida nem tinha sido ultra explorada como a própria Praga. É um lugar deslumbrante, uma ótima cidade-spa, que conta com o Grand Hotel Pupp, o antigo prédio do spa chamado Lazne I, que se tornou o Cassino Royale. A geografia combinava perfeitamente. Infelizmente, Lazne estava em péssimo estado, mas com um pouco de atenção, carinho, a ajuda do grupo de preservação local, e mais o nosso dinheiro, eu acho que nós o restauramos à sua condição original. Quando terminamos nosso trabalho, ele ficou lindo. Lazne I era um spa antigo e todos os quartos continuavam lá, embora não fossem mais usados. Mas trata-se de um prédio muito bonito.

E quanto às Bahamas?

Bem, nós queríamos um visual caribenho romântico. E eu já tinha viajado às Bahamas várias vezes e achava que, se íamos filmar por lá, deveríamos usar Nassau. Seus atrativos foram a conveniência para se chegar lá e sua proximidade dos EUA.

E imagino que o senhor já tenha estado lá nos filmes anteriores de James Bond?

Na verdade, nós fomos convidados a ir a Paradise Island e usamos Paradise Island em 007 Contra a Chantagem Atômica (Thunderball), mas mudou bastante desde então. Quando filmamos Thunderball, a praia era aberta e havia um campo de golfe que não era usado, eles só mantinham o green e pronto. Nessa volta, tudo estava diferente porque a ilha está bem mais habitada. E eu nem tinha percebido como ela era grande, porque nós usamos somente um pequeno trecho dela da primeira vez. E, na verdade, primeiro nós visitamos a ilha e selecionamos uma locação que queríamos usar como uma favela. Mas quando voltamos com Martin, o lugar havia sido renovado! (risos). Foi uma decepção.

E o que vocês fizeram?

Nós levamos Martin a um local onde costumávamos jantar quando estávamos rodando 007 - O Espião Que Me Amava (The Spy Who Loved Me) e que agora está abandonado, e ele se tornou a base da nossa favela. E visitamos Coral Harbour, outra locação usada em 007 Contra a Chantagem Atômica (Thunderball), onde havia um prédio em construção que seria um hotel, mas que nunca foi concluído por algum tipo de litígio ou pendência. E Martin o achou maravilhoso, então nós também o usamos.

E quais sets o senhor construiu nos estúdios de filmagem de 007 em Pinewood?

Bem, nós construímos aqui o interior da casa que afunda e que é cenário de uma cena grandiosa supostamente passada em Veneza. Nós construímos uma maquete da casa que afunda para ser colocada no verdadeiro Grand Canal. E montamos (no estúdio de Pinewood) um campo de guerrilha que deveria estar em Black Park, em Uganda. E construímos um dos pavilhões de críquete da Eton College para uma partida de críquete.

Procure se lembrar do seu estado de espírito à época daquele primeiro Bond. Quais eram as suas expectativas? Provavelmente, o senhor não pensava, Vou fazer esses filmes pelos próximos 40 anos…

Não. Eu fui contratado como desenhista técnico. Conheci Ken Adam e ele me deu uma pasta enorme; era a fachada externa de Fort Knox, e ele disse: Comece trabalhando nisso... E lembro que ele vinha diariamente conferir como tudo estava indo. Naquele mês, eu projetei tudo e construí uma maquete. E lembro que Guy Hamilton (diretor), Cubby (Broccoli, produtor) e Harry (Saltzman, produtor) examinaram tudo e disseram, Bom, vamos orçar e ver quanto vai custar... E eu quase caí para trás, porque o orçamento foi de £ 56.000 libras esterlinas, o set mais caro que já havia sido projetado até então. Eu pensei, Ai, meu Deus, vou ser demitido por conta disso. Mas ninguém ligou a mínima. Guy disse: Ora, elimine este pedaço e aquele, vamos fazer isso e aquilo… e o orçamento caiu para £ 40.000 libras. Aí então eles disseram, Tudo certo, podem construir! E nós fizemos o paisagismo do local e construímos a rua de concreto de Black Park, nos estúdios de Pinewood. Foi incrível. Nós rodamos toda a seqüência e, quando o filme estava pronto, Peter Hunt (montador) fez algumas tomadas aéreas em torno do verdadeiro Fort Knox, pois eles não nos deram permissão para filmar no local. Aí então, nós fizemos a fachada externa, juntamente com aquele set maravilhoso do Ken para o interior do prédio, onde Oddjob (Harold Sakata) encontra seu destino nas mãos de Bond.

Quando o senhor concluiu o trabalho no filme esperava voltar a trabalhar com a equipe de Bond?

Bem, Harry me chamou à sala dele e disse, Tire férias, porque teremos muito trabalho pela frente... Eu lembro que trabalhei em The Ipcress File, e então Ken entrou no escritório um dia, dizendo: Crianças, vamos fazer 007 Contra a Chantagem Atômica (Thunderball). E aí ele disse: É bom alguém aprender mergulho submarino. Lembro que me matriculei numa escola de mergulho em Slough e fiz um curso relâmpago para que quando fôssemos às Bahamas, eu conseguisse trabalhar no set submerso. Nós construímos o interior de um bombardeiro Vulcan, com as armas atômicas e todos os demais equipamentos, que precisava submergir a quase 20m de profundidade. Esse era meu trabalho. Eu viajei até lá para trabahar duas semanas e fiquei 14.

O senhor teve uma carreira obviamente admirável...

Bem, eu trabalhei muito e sei fazer um ótimo chá. (risos)

O senhor fez muitos outros filmes, mas Bond pontuou a sua carreira, não é?

É verdade. Já faz bastante tempo e tem sido maravilhoso. Eu fiz outras coisas. No último ano comemoramos 40 anos da franquia, com 20 filmes, ou seja, um filme a cada dois anos. Eu fazia um filme, saía para fazer outra coisa e voltava novamente. Eu acho que foi só uma questão de sorte. E eu fico muito satisfeito em trabalhar nesses filmes. Eles são muito divertidos e formamos uma gigantesca família. A política de Cubby era sempre: ‘Se você tem alguma coisa a dizer, fale, porque pode ser bobagem ou pode ser o início de algo maravilhoso, mas pelo amor de Deus, fale.’

Como era o Cubby?

Uma pessoa maravilhosa que sempre pensava na equipe. Ele costumava sempre nos encontrar no bar em todo lugar que fôssemos e pagava bebidas para todo mundo. Ele era maravilhoso. Toda a família é ótima.

Qual a razão do sucesso desses filmes?

Eu acho que é serem lançados no momento certo com produções de alto nível. Nós sempre tentamos fazer o melhor possível. Mesmo agora, nós tentamos não usar trucagens em excesso. Tentamos fazer as coisas para valer. Quando o espectador vir uma perseguição automobilística em 007 Cassino Royale, vai ficar impressionado com o que fizemos, porque é real.

O senhor fará o próximo filme de Bond?

Tomara que sim.

Importa-se de me dizer a sua idade?

Faço 77 este ano. E continuo me divertindo tanto agora quanto no início.

Do que o senhor mais gosta?

Bem, como eu sempre digo, eles são boa gente e temos muita liberdade. E é ótima a sensação de que estamos todos na mesma equipe tentando fazer um trabalho de primeiríssima. A minha filosofia é a de que quando eu começar a fazer um trabalho de segunda, é porque é hora de parar.

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