Em uma cena de 007 - Operação Skyfall, James Bond (Daniel Craig) precisa de armas e vai encontrar Q em um museu. O inventor e fornecedor de arsenal da franquia retorna neste 23º filme interpretado por um ator mais jovem, Ben Whishaw. Os dois sentam lado a lado, diante de uma pintura de um barco de guerra rebocado. Q enxerga ali a melancolia da finitude das coisas. 007 enxerga só "um barco grande".
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Convocado a pilotar uma barca de 50 anos de idade, Sam Mendes parece ver nisso uma missão maior: uma responsabilidade de artista. É o primeiro cineasta "com assinatura" a dirigir um filme da franquia - conhecida por empregar diretores de aluguel e competentes executores - e, por isso mesmo, Mendes traz consigo o peso do autorismo, evidente na fotografia "artística" cheia de contraluzes e na quantidade de simbolismos por minuto de Operação Skyfall.
O velho versus o novo, o analógico versus o digital - as metáforas se enfileiram na trama, em que a segurança de M (Judi Dench) e de todo o MI-6 é desafiada por uma ameaça do passado, Silva (Javier Bardem). Como James Bond representa o velho, ele usa navalha, faca, espingarda, trator, rádio, enquanto Silva prefere helicópteros e computadores. O fato de o vilão negar o arcaísmo do macho em nome de uma visão mais moderna da sexualidade é mais um dentre esses muitos simbolismos autorreferentes.
Como Bardem é ótimo mesmo no papel mais afetado, esse antagonismo é o elemento que melhor se sustenta em Operação Skyfall, um castelo de cartas que a todo momento periga se sufocar na sua metanarrativa e ruir sob o peso do solene. Na ação, Mendes às vezes confunde elegância com pose. A cena de luta em Xangai, iluminada só pelos outdoors dos prédios, parece um número do Cirque du Soleil; enche os olhos e tal, mas está longe da desafetação da fotografia noturna urbana de um Colateral, por exemplo.
Se Operação Skyfall é um filme que funciona, no fim das contas, é porque o discurso do velho contra o novo sempre esteve centralmente no subtexto na franquia. O 007 de Daniel Craig brinca, diz que seu hobby é a ressurreição, mas James Bond, enquanto ícone da altivez do império obsoleto do "buldogue" Winston Churchill, sempre precisou se reinventar diante das mudanças. Os Bonds de Roger Moore tinham mais humor porque o absurdo era uma forma de ingleses, escanteados por EUA e URSS, enxergarem a Guerra Fria e a corrida espacial do lado de fora. Já nos anos da AIDS o Bond de Timothy Dalton também precisou se adaptar, uma vez que não pegava ninguém.
O que Sam Mendes faz aqui, no aniversário de 50 anos, é transformar todo esse subtexto em texto.
Da "trilogia" que se encerra, Operação Skyfall é evidentemente melhor do que Quantum of Solace mas não tem a qualidade de Cassino Royale (um filme que também era sério e cheio de temas e autorreferências mas não caia na armadilha do autorismo). Se daqui em diante teremos mais filmes "de autor" na cinessérie, é uma questão que fica aberta. Por enquanto, James Bond conseguiu por pouco, na base da auto-homenagem, evitar que virasse de vez uma peça de museu.
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Ano: 2012
País: EUA
Classificação: 14 anos
Duração: 145 min
Direção: Sam Mendes
Roteiro: John Logan, Robert Wade, Neal Purvis
Elenco: Daniel Craig, Judi Dench, Javier Bardem, Ralph Fiennes, Naomie Harris, Bérénice Marlohe, Albert Finney, Ben Whishaw, Rory Kinnear, Ola Rapace, Helen McCrory, Nicholas Woodeson, Bill Buckhurst, Elize du Toit, Ian Bonar, Tonia Sotiropoulou, Wolf Blitzer