O cineasta José Eduardo Belmonte faz o tipo calmo. Passa boa parte do tempo acompanhando a média distância enquanto a equipe de arte monta o cenário e o diretor de fotografia acerta o enquadramento. Não raro, passa os intervalos entre os takes conversando com os produtores, ouvindo suas opiniões. Mas quando chega a hora de gritar "ação", ele gosta de ver seus atores "pilhados". Faz exercícios para aumentar a adrenalina, chama de canto alguém do elenco para combinar uma surpresa e, assim, deixa os outros ligados com o que pode acontecer a qualquer momento. Quando o momento chega e as coisas dão certo, é o primeiro a aplaudir. Se não saem como planejado, pode até soltar uma bronca, mas logo depois pede desculpas pela possível rispidez.
A pressão em cima de seus ombros anda grande. Ele está atualmente morando no Rio de Janeiro, onde dirige Alemão, longa-metragem que mostra a história de um grupo de policiais infiltrados no complexo do Alemão às vésperas da ação que acabou libertando a região do domínio imposto pelos traficantes. Contra o cineasta correm os relógios. O cronograma de filmagem é de apenas três semanas e já existe uma data ideal para a estreia: fim de novembro, quando a pacificação completa três anos.
Mas mesmo assim, o que mais se ouve pelos corredores dos sets de filmagem são os aplausos e comentários de quem está satisfeito com o trabalho e a entrega de seus atores. E estamos falando de um grupo que equilibra rostos já conhecidos do grande público, como Cauã Reymond, Antônio Fagundes e Caio Blat, atuando ao lado de jovens, como Mariana Nunes e Marcello Melo Jr.
Em uma das diárias a que o Omelete teve acesso, os atores iam se aglomerando ao redor dos monitores onde era possível acompanhar o movimento das câmeras - duas RED Epic captando tudo a 4K (o dobro da qualidade de um blu-ray). Mesmo quem já não estava mais em cena continuava por ali para assistir às cenas, que naquele dia envolveram explosões, tiros e muito barulho. Cada "morte" era rodada pelo menos três vezes, uma com efeitos de iluminação, a segunda com espoleta nas armas marcando os tiros e uma terceira com explosivos nas roupas, que sempre aumentavam o grau de realismo na atuação.
O cenário era o porão de uma pizzaria localizada no morro. Ali era o ponto de encontro dos policiais infiltrados interpretados por Blat, Otávio Muller, Milhem Cortaz, Gabriel Braga Nunes e Melo Jr.. Trata-se da principal locação do filme, onde foram rodadas oito diárias, em um ambiente claustrofóbico e milimetricamente montado para ficar com cara de improvisado. Vê-se por ali apenas um colchão, um baú, uma geladeira e uma mesa com uma única cadeira, além de caixas de pizza e muitas coisas velhas, de ventilador e gaiola a escadas e espelhos.
A fotografia de Alê Ramos abusa dos ângulos, luzes e sombras. O flare constantemente entrando na lente deve dar ao espectador a sensação de que está participando da trama também e complementa a ampla cobertura jornalística à invasão do morro, em 2010, que teve como cenas mais marcantes os bandidos correndo pelo mato acompanhados pelos helicópteros e, depois, reportagem que mostrava a luxuosa casa de um dos chefes do tráfico.
Playboy sobe o Morro do Alemão
No dia seguinte à filmagem do tiroteiro, o Omelete subiu o Morro do Alemão. Depois de duas semanas de chuva e tempo feio no Rio de Janeiro, a produção viu o sol brilhar no dia que mais precisava. Estavam marcadas para a quinta, véspera do feriado de Páscoa, as filmagens da cobertura do chefe do tráfico conhecido como Playboy.
Na laje de uma casa alugada pela produção, Cauã Reymond veste uma camisa do Flamengo, agasalho vermelho com arma prateada na cintura e, cheio de marra, arrasta seus chinelos de um lado para o outro enquanto ouvia música em seu fone de ouvido e fumava charuto. Sempre bastante simpático e atencioso com as pessoas, neste dia Cauã se limita a apenas acenar com a cabeça. O galã da novela não subiu o morro, quem está ali é o personagem e ao seu lado estão os seus soldados de maior confiança, Senegal, Caveirinha e Zuim. Na cena juntos, eles discutem o que fazer agora que sabem da presença de policiais infiltrados no morro.
O primeiro sorriso só sai do rosto de Reymond quando o sol inicia a descida atrás do teleférico e as luzes das casas do morro começam a se ascender. Após uma improvisação de texto do seu colega em cena, Cauã finalmente sai do personagem por alguns segundos. Mas não demora para Playboy voltar ao comando e, na última sequência acompanhada pela reportagem, Cauã, sem camisa, faz exercícios enquanto questiona sua vida de bandido. Ao final, se levanta e vai fazer barras. E o público feminino atrás das câmeras suspira e, como o diretor, aplaude a cena.
P.S. Para finalizar a reportagem em grande estilo, a descida do morro foi na garupa de uma moto.