A proposta de Better Call Saul sempre foi muito clara: retornar ao universo de Breaking Bad para contar a história de como o pacato Jimmy (Bob Odenkirk) se tornou o advogado trambiqueiro que às vezes tirava os protagonistas do aperto. O sucesso da série original, de fato, nunca abandona a esteira da carreira de Vince Gilligan, seu criador. Anos e anos depois, o showrunner continua preso ao mesmo universo, tanto na série derivada quanto no recente longa-metragem El Camino. Tudo ainda muito bem feito, mas inevitavelmente atrelado a um passado que não parece conseguir alcançar superação.
Então, nada mais adequado que admitir que o futuro é uma questão de reencontrar Breaking Bad. Que no final das contas, ainda que procure por uma identidade, a série de Saul Goodman tem essa função: satisfazer os fãs do material original. Não há nenhum pecado nisso, não há nenhum desmerecimento nessa afirmação. É uma simples verdade. De certa forma, há uma torcida silenciosa para que ao final de Better Call Saul, na sexta temporada, Gilligan possa perseguir novas possibilidades e esse universo possa descansar por algum tempo. Até lá, ainda temos algumas questões para resolver.
Depois de quase dois anos fora do ar, voltamos para a quinta temporada estabelecendo o início da transformação de Jimmy em Saul. E é importante afirmar que se trata de um início, porque com mais um ano pela frente, está bem claro que o protagonista vai andar a passos muito lentos por esse novo terreno. De fato, está na hesitação dos roteiros acerca de Jimmy o desequilíbrio que acabou não deixando essa première tão interessante. Isso acabou sendo frustrante em alguns momentos, já que essa é uma produção de cartas bem marcadas e que não pode, de modo algum, transformar essa premissa em coadjuvante da própria história. Depois de quatro temporadas sondando quem Jimmy poderia se tornar, é hora de mergulhar de verdade em quem ele poderá ser.
Descontos
Mais uma vez começamos o ano com as sequências em preto e branco que vão se complementando. Há poucas informações adicionais que já não conhecêssemos, com destaque para uma boa ponte com o filme El Camino, que por si só já é uma ponte com Breaking Bad, como das muitas que vão acontecer adiante. Sabemos que as coisas vão se estreitar muito esse ano, quando a presença de Hank (Dean Norris), cunhado de Walter White (Bryan Cranston), se tornou uma realidade. Entre outras coisas, essa aproximação com o ponto em que Breaking Bad começou é um dos mais esperados pelos fãs. O outro é continuar acompanhando como Jimmy vai se corromper definitivamente.
Quando ele começa sua campanha para divulgar o novo nome – e a nova marca – ele oferece para todos os interessados 50% de desconto em seus serviços. Quando a quinta temporada começa, ela retira da própria narrativa 50% da atenção ao que deveria ser o foco: a nova empreitada do protagonista. Os dois episódios que já foram exibidos em sequência ainda foram bem dirigidos e apurados tecnicamente, mas o roteiro era moroso, arrastado, envolvido em mais de 50% com a narrativa do tráfico entre Gus (Giancarlo Sposito) e os Salamancas chefiados por Lalo (Tony Dalton); mais uma vez como se a convergência com Saul fosse demorar uma eternidade para acontecer.
Sim, porque essa convergência ajudaria muito a série, promoveria uma homogeneidade dos acontecimentos, parando de bifurcar a narrativa em linhas tão paralelas. Isso já aconteceu por tempo demais. Ao final do episódio dois, contudo, Gilligan pode ter percebido que essa fronteira já foi alcançada e parece ter providenciado a reunião de todos esses elementos num só objetivo. Nacho (Michael Mando), Gus e Mike são personagens interessantes, mas é um pouco alarmante perceber que tanto dessa estreia foi dedicada ao desenvolvimento deles e não de Jimmy, que se ateu a algumas sequências cômicas isoladas. Foram episódios editados a favor dos coadjuvantes, apenas.
Ainda assim, nos poucos momentos que tivemos com Jimmy os roteiros ofereceram coerência e diversão. Ele precisa mesmo começar aos poucos. Nesse ponto ele quer se dar bem, mas ainda tem um pouco da vontade de que seu trabalho seja reconhecido por algo de bom. Se daqui por diante a série se esforçar mais para situar o personagem no centro dos acontecimentos, ele tem tudo para brilhar como em nenhuma outra temporada. A hora é de Odenkirk, mais que nunca. Deixem-no trabalhar.