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Pacificador zomba sem censura de seu próprio conceito

Com menos limitações que O Esquadrão Suicida, série de James Gunn eleva violência e sátira política em seus primeiros episódios

Nico
11.01.2022, às 08H00.
Atualizada em 28.02.2024, ÀS 00H47

Nos últimos anos, Aves de Rapina: Arlequina e Sua Emancipação Fantabulosa e O Esquadrão Suicida mostraram o potencial que blockbusters de super-heróis podem ter quando seus realizadores têm a liberdade para levar sua criatividade para as telonas. James Gunn, diretor e roteirista do longa de 2021, divertiu a si mesmo e ao público ao massacrar personagens do mais baixo escalão da DC Comics das formas mais exageradas o possível e, agora, traz a mesma sede de sangue para Pacificador, que chega nesta quinta-feira (13) à HBO Max. A série, no entanto, tem uma grande diferença para o filme que a antecede: exclusiva para o streaming, a produção não precisa conter sua sanguinolência para “agradar” censores. O resultado, pelo menos neste início de programa, é uma sequência violenta, divertida e absurda de acasos que, somados, formam uma narrativa estranhamente apaixonante.

Iniciada alguns meses após os acontecimentos de O Esquadrão Suicida, Pacificador mostra o personagem de John Cena fugindo do hospital após se recuperar das lesões que sofreu ao fim do filme. Em poucos minutos, no entanto, ele é rastreado por Harcourt (Jennifer Holland), Economos (Steve Agee), Murn (Chukwudi Iwuji) e Adebayo (Danielle Brooks), agentes responsáveis por uma operação para eliminar indivíduos do misterioso Projeto Borboleta. Daí para frente, Gunn precisa de pouquíssimos diálogos para estabelecer a hierarquia da equipe e construir a dinâmica que o grupo terá nas próximas semanas.

Sem firulas, os personagens principais de Pacificador têm seus respectivos papéis dentro da trama definidos desde suas apresentações, o que não quer dizer que eles sejam rasos ou dependam do mercenário-título para funcionar. Inclusive, a série promete em seus diálogos que cada um dos agentes será desenvolvido em sua própria linha narrativa paralela tanto quanto na principal.

A evolução desses personagens também está presente na boa atuação do elenco principal, liderado por Cena. Colocado como o principal atrativo de Pacificador, o astro se estabelece como um dos atores mais carismáticos do DCEU e domina igualmente cenas de ação e de comédia, que mira na estupidez e na hipocrisia do mercenário. Holland e Brooks também se destacam ao transformar Harcourt e Adebayo em bússolas emocionais da série. Mesmo que suas personagens estejam, por enquanto, longe de serem amigas, é por meio de conversas entre elas que Gunn define o tamanho dos riscos enfrentados pela equipe e o impacto que o fracasso de sua missão pode ter em suas vidas e naqueles que as cercam.

O desenvolvimento do exagero

Diferentemente de O Esquadrão Suicida, que potencializou seu absurdo para divertir e chocar, Pacificador incorpora o exagero e violência em sua trama para desenvolver seus personagens para além da troca de tiros e ofensas. É com o frequente derramamento de sangue que a série justifica traumas, medos e decisões de seus principais personagens, que têm reações bem mais críveis aos massacres que presenciam do que o que é visto na maior parte das produções do gênero, em que mortes e desmembramentos são frequentemente recebidos com indiferença.

Há também um exagero na caracterização dos personagens de Pacificador, usado por Gunn para impedir leituras reacionárias da série. Ciente de que críticas em subtexto normalmente passam despercebidas em meio à porradaria, o cineasta se desprende de qualquer tipo de sutileza e associa de forma explícita os preconceitos e hipocrisias do protagonista à sua estupidez e ignorância política. Embora construa seus personagens de forma competente o bastante para que o público se ligue a eles, o diretor faz questão de lembrar a todo momento que estamos assistindo personagens racistas de ideologias ultraconservadoras e cuja noção de justiça é tão distorcida quanto a de figuras genocidas.

Com um início animador, Pacificador promete entregar mais do que uma hora semanal de trocação boba e vazia. Expandindo a crítica que Gunn arranhou em O Esquadrão Suicida, a série mostra ter potencial para ser, ao mesmo tempo, uma das produções mais significativas e mais divertidas em quase dez anos de DCEU.