Abracadabra 2/Disney+/Reprodução

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Crítica

Abracadabra 2 frisa o que já sabíamos: o primeiro filme é ótimo

Entre reprises de piadas, sequência dá mais ênfase ao que torna bruxas alvos de perseguição e fascínio

07.10.2022, às 16H46.

É um tanto louvável a falta de embaraço da diretora Anne Fletcher em assumir que Abracadabra 2 existe única e exclusivamente em nome da nostalgia. Não porque essa onda conservadora de celebração do passado seja cativante ou uma experiência completa em si mesma, mas por assumir descaradamente que, 30 anos depois, o original segue tão atual e redondinho que sequer vale o esforço de tentar renová-lo. Então, se é para continuar essa história, melhor do que travar uma guerra com a memória alheia é criar as condições ideais para que as atrizes Bette Midler, Kathy Najimy e Sarah Jessica Parker façam o que fizeram tão bem antes — e, quem sabe assim, prestar a devida homenagem ao filme antecessor.

Diante disso, pouco importa como as irmãs Sanderson voltaram, se foi pelo sonho infantil de um adulto aspirante a bruxo ou por uma trapalhada adolescente de uma feiticeira de fato; se o alvo da vez são crianças ou o antepassado do grande responsável pelo seu exílio em Salem. O primordial é representar e, com sorte, elevar o que tornou Winnie, Mary e Sarah tão memoráveis — ou seja, seu humor, sua química e sua determinação inabalável —, com as devidas atualizações. Por isso, enquanto um aspirador de pó fez as vezes de vassoura no primeiro filme, elas agora descobrem que podem voar até mesmo se apoiando em aspiradores robôs. Sua obsessão por beleza e juventude, por sua vez, encontra ecos na obsessão coletiva por cremes, séruns e cosméticos, todos disponíveis na farmácia com a vantagem de dispensar sujar as próprias mãos com sacrifícios. Quer dizer, são as mesmas piadas, os mesmos temas, mas repaginados para os novos tempos.

Embora exista recompensa nas reprises, Abracadabra 2 tem consciência de que, mesmo se assumindo nostálgico, paga um preço pela repetição. Não tem como: é sempre mais engraçado, divertido e emocionante na primeira vez e, ao se colocar a serviço do original, o novo filme atesta sua subalternidade. No entanto, aproveita esse papel para enfatizar o que talvez tenha passado discretamente pelos olhos do espectador à época do primeiro filme. Ao determinar que as novas adversárias das irmãs Sanderson são três melhores amigas em crise, ele cria um espelho para a própria dissonância das protagonistas e a torna uma questão a se aprofundar. Afinal, Winnie prefere vencer ou estar do lado das suas irmãs? Em outras palavras, qual é a relevância da irmandade entre elas?

Nesse sentido, Abracadabra 2 torna mais explícito o subtexto feminista do seu antecessor ao reconhecer que a magia é só o elemento mais imediato do que significa ser uma bruxa. Porque, com a inclusão de flashbacks e comentários sobre a história de origem das irmãs Sanderson, se entende não só sua união, mas que, no fundo, elas são alvos de perseguição e de fascínio por serem escandalosamente coerentes com suas vontades, ambições e individualidades e, assim, capazes de questionar a ordem à sua volta.

Nada disso seria eficiente se Midler, Najimy e Parker não se entregassem novamente por completo à bobeira, e é impressionante como parece que o tempo não passou entre uma aventura e outra. As irmãs Sanderson causam o mesmo encantamento de 30 anos atrás e não à toa, por mais divertidas que sejam às adições ao elenco, que inclui os talentosos Tony Hale e Sam Richardson, ninguém é capaz de tirar os holofotes do trio que deu a Salem sua fama. Mas, convenhamos, este é só mais um motivo para que se revisite o original.

Nota do Crítico
Bom