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A Árvore | Crítica

Em seu segundo filme, Julie Bertuccelli volta a falar de lutos, agora munida de simbolismos

06.01.2011, às 18H59.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 14H14

Há filmes que se apoiam em um simbolismo, e há os que só existem em função dele, como A Árvore (The Tree, 2010). Em ambos os casos existe o perigo de engessar a narrativa com o artifício, e é o que acontece com o segundo longa da diretora Julie Bertuccelli (Desde que Otar Partiu).

a árvore

a árvore

a árvore

Charlotte Gainsbourg vive Dawn, francesa que se mudou para a Austrália por amor e que já carrega no nome um símbolo da passagem do tempo, elemento importante do filme. Embora viva no idílico cenário do campo de Moreton Bay, perto de Brisbane, a condição de estrangeira de Dawn nunca se dilui. Veremos, em seguida, que o idílio pode ser penoso, apesar de toda a beleza.

Fã de O Barão nas Árvores, de Ítalo Calvino, a diretora enxergou no romance Our Father Who Art in the Tree, de Judy Pascoe, uma forma de adaptar indiretamente o livro de Calvino ao cinema, por meio de outra obra. A Árvore é também um parente de Desde que Otar Partiu, já que ambos os filmes examinam o luto.

Não convém aqui explicar por que a tristeza invade a vida de Dawn, mesmo porque sua inadequação dá a entender que a personagem, mesmo quando era feliz, nunca o foi plenamente (a imagem do casal deitado na rede, que abre o filme, sugere essa suspensão, essa fragilidade). Pra resumir em forma de simbolismo, Dawn já é incompleta desde o começo porque não tem nessa terra raízes.

É isso que, inicialmente, provoca seu mal-estar, mas é também seu caráter transitório que talvez permita a Dawn recomeçar no futuro. Por enquanto existe a árvore, a gigantesca figueira que faz sombra na casa da personagem. Julie Bertuccelli esgota as licenças poéticas dessa imagem: os filhos de Dawn desenham seus lugares em uma árvore genealógica no papel, a figueira invade a cama da mulher, a árvore até "veste" uma camisa no final.

Fica entre o realismo fantástico e o simples abuso de metáforas a forma como a trama se desenrola ao redor da árvore. Entrar na brincadeira e acreditar que a figueira possa realmente receber um espírito de uma pessoa talvez alivie um pouco o peso de tanto simbolismo, mas isso não tira da obra suas amarras.

O que é uma pena, porque A Árvore tinha potencial para ser um drama de superação de luto que evita as armadilhas sentimentais desse tipo de filme. Ao inserir a personagem num cenário perfeitinho, colorido, e sugerir que não basta a paisagem para garantir sua felicidade, Bertucelli "blinda" Dawn contra os maus acasos da vida. A fleuma de Charlotte Gainsbourg poderia sugerir que Dawn é só uma vítima das circunstâncias, mas não é isso que nós vemos. Desde o começo tudo o que o filme faz é fortalecê-la, não só contra os lutos inevitáveis como também contra a inadequação mais profunda.

A Árvore | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Regular