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Crítica

Assassinato em Gosford Park | Crítica

Longa que abala as aparências da finesse e da boa conduta

13.03.2002, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H12

Até parece chavão de filme B: Quando o assunto é crítica e acidez, o nome é Robert Altman. De fato, sem exageros, o cineasta norte-americano, nascido em 1925, preocupa-se enormemente em fazer de seus filmes verdadeiros libelos da contestação. Os temas enfileiram-se, produção após produção – desde a Guerra da Coréia, em MASH (1970), passando pelas entranhas de Hollywood em O jogador (The Player, 1992), até o retrato das passarelas e do universo feminino, em Prêt-à-Porter (1994) e em Dr. T e as Mulheres (Dr. T & the Women, 2000).

Curiosamente, um diretor bem-lembrado em indicações ao Oscar, quatro oportunidades, Altman nunca levou o prêmio. A minha intenção é fazer filmes que agradem a uns poucos e desagradem a muitos, costuma proclamar. A sua nova chance surge em 2002, com a comédia Assassinato em Gosford Park (Gosford Park, 2001). Além de concorrer na categoria de Direção, a película disputa como Melhor Filme, Melhor Atriz Coadjuvante (Hellen Mirren e Maggie Smith), Melhor Roteiro Original, Melhor Direção de Arte e Melhor Figurino. A temática, claro, envolve posições defendidas pelo diretor com afinco, demonstradas em doses leves mas constantes, inseridas em colocações de câmera, em diálogos e em desdobramentos da trama.

O alvo de Altman concentra-se na aristocracia britânica. Pela primeira vez, o cineasta viajou até a Inglaterra para produzir uma película, utilizou um esplêndido naipe de figurinos inspirados nos anos 30 e recrutou um elenco de atores ingleses do mais alto gabarito. O resultado, uma obra que abala as aparências da finesse e da boa conduta – e escancara verdadeiras relações pessoais, a saber, ganância, empáfia, luxúria e insensibilidade.

Em 1932, o emergente Sir William McCordle (Michael Gambon) e a sua esposa, Lady Silvia (Kristin Scott Thomas), convidam um seleto grupo de amigos para um fim-de-semana na sua mansão, em Gosford Park. A programação inclui chás, caça a aves, jantares suntuosos e noites ao piano. E como não se sustenta um lorde sem o seu respectivo fiel empregado, a visita à mansão também pressupõe uma legião de cozinheiras, serviçais, choferes e mensageiros. No andar de baixo, aloja-se a baixa sociedade. No de cima, repousa o baronato.

Logicamente, a estratificação das classes não segue uma regra rígida. Empregados, como a arrumadeira Elsie (Emily Watson) e o acompanhante Henry Denton (Ryan Phillippe), atendem a pedidos sexuais e auxiliam nas intrigas. Aqui, além da condução de Altman, brilham as atuações do numeroso elenco, principalmente de Maggie Smith, no papel de uma condessa esnobe, e de Hellen Mirren, a governanta. Quanto às personagens, no geral, não se salva grupo algum, todos atentam apenas para os próprios interesses. O diretor apenas inclui o costumeiro assassinato-ao-apagar-das-luzes, típico dos mistérios de Sherlock Holmes, para reforçar a idéia da omissão coletiva. Ninguém se interessa pelo morto. A culpa sempre recai sobre o mordomo porque todos buscam simplesmente se safar.

Nota do Crítico
Ótimo