Se você já viu pelo menos cinco filmes de ação hollywoodianos na vida, certamente entenderá as nuances e reviravoltas de Bad Boys: Até o Fim. Num contexto em que a indústria em crise se refugia ainda mais no garantido, o quarto longa da série estrelada por Will Smith e Martin Lawrence preza pela máxima muito usada nos esportes: em time que está ganhando, não se mexe.
Em 1995, o diretor Michael Bay apresentou o primeiro Bad Boys ao mundo e fez explodir as carreiras de sua dupla de protagonistas - além da sua própria carreira como diretor de filmes de ação. A fórmula de misturar ação estilizada - corrente nesse período que Hollywood importava de Hong Kong os estilistas da ação como John Woo e Tsui Hark - com o ótimo timing cômico dos atores deu tão certo e parece tão atemporal que mesmo os intervalos longos não impediram a franquia de voltar em 2003 e 2020 com poucas variações no seu formato.
No caso do terceiro longa, a dupla Adil El Arbi e Bilall Fallah assumiu a direção e fez de Bad Boys para Sempre um sucesso que emula bem os maneirismos de Bay - do slow motion em panorâmica às cores fortes que realçam as paisagens e temperaturas de Miami. Se a vilã da vez não poderia ser mais clichê ou esquecível, isso também faz parte da estratégia de repetição: tudo o que orbita a fotogenia de Smith ou as piadinhas de Martin Lawrence é meramente acessório e cambiável.
Em Bad Boys: Até o Fim, Arbi e Fallah mais uma vez fazem o popular "arroz com feijão". O filme mostra Mike (Smith) e Marcus (Lawrence) trabalhando para salvar o nome e o legado de seu amado capitão Howard (Joe Pantoliano), morto no filme anterior. Envolvidos em uma armação que os colocam como procurados pelas autoridades, os dois são obrigados a unir forças com Armando (Jacob Scipio), ex-vilão e filho perdido de Mike, para limpar seus nomes.
Bad Boys: Até o Fim mostra que a receita da franquia ainda dá caldo. Na falta de ousadias narrativas, o roteiro escrito pelo trio Chris Bremner, Will Beall e George Gallo atualiza minimamente a situação de Mike e Marcus - que na trama do filme lidam com questões de saúde - para permitir que os personagens se renovem nessa vulnerabilidade. O resultado oxigena o que se espera de um filme marrento para o público de Bad Boys, e Lawrence particularmente tira o melhor da situação. De qualquer forma, todos os envolvidos com o longa parecem saber que não é necessário reviravoltas mirabolantes - bastam algumas boas piadas e a química invejável entre Smith e Lawrence para que a experiência pareça completa.
A premissa denota um nítido cuidado em respeitar as atuais limitações de seus astros impostas pela idade, que deixam as principais sequências de ação para o elenco jovem encabeçado por Scipio. A predileção da dupla de diretores pelas sequências em close-up (como aquela de Will Smith com o colete estabilizador que está rodando as redes em um vídeo de making-of) facilita o trabalho dos atores; de resto, Smith ainda tem físico para uma ou outra cena mais elaborada, e Lawrence aperfeiçoa o papel de alívio cômico que sempre lhe coube. Até mesmo o vilão caricato de Eric Dane merece crédito, que, apesar de não ser um personagem marcante, já é um grande avanço em comparação à La Bruja vivida por Kate del Castillo no longa anterior.
Para além da constatação de que Bad Boys ainda tem algum fôlego, este quarto filme mostra bem em que medida Hollywood se permite autoralidade hoje em dia nos seus blockbusters. Duas situações de roteiro com ecos autobiográficos - a primeira relembrando o incidente que deixou Lawrence em coma em 1999, a segunda reproduzindo, numa licença poética, o tapa que Will Smith deu em Chris Rock no Oscar - já soam um sopro de liberdade criativa.