Sempre é agridoce assistir a documentários de estrelas talentosas e controversas da música. Por um lado, há uma grande devoção por aqueles que se foram de forma trágica. Por outro, há a hipocrisia de uma sociedade que julgou aquelas pessoas em vida. O sentimento não é diferente com Chorão: Marginal Alado, produção sobre a vida e a obra do vocalista do Charlie Brown Jr. Com uma linguagem que mistura alegria e certa melancolia, o filme narra a vida do músico desde o começo nas pistas de skate, até sua morte trágica em 2013, e tem o potencial de deixar os fãs da banda com lágrimas nos olhos.
Com depoimentos de profissionais da indústria e amigos de Chorão, o filme foca especialmente na personalidade do músico - e em como a imagem marrenta que ele passava para o público era diferente do artista emotivo na intimidade. Marginal Alado traça de Alexandre Magno Abrão o perfil de um homem cheio de paixão pela vida, pela arte que fazia, capaz de despertar esse mesmo sentimento nas pessoas ao seu redor. Essa energia talvez seja um dos segredos do sucesso do Charlie Brown Jr.: era difícil não ser levado pela voz e pela sinceridade daquele rapaz de bermuda no palco.
No documentário, Chorão é acima de tudo um letrista com urgência de se expressar, despejando suas angústias, amores e conquistas nas músicas do Charlie Brown Jr. O filme também destaca como Chorão conversava com seu público durante os shows, fazendo grandes discursos motivacionais entre as músicas. E não leve a palavra “motivacional” à mal. As palavras de Chorão funcionaram porque não eram vazias. Pelo contrário, vinham de experiências que o músico viveu na pele, especialmente antes de se tornar famoso. Como já dissemos em um texto aqui no Omelete, o Charlie Brown Jr. cantou a realidade brasileira de uma forma única e muito disso vinha da personalidade de Chorão.
Amor, raiva e perdição
Engana-se, porém, quem acha que Marginal Alado só mostra os pontos positivos sobre a vida do músico. O documentário mostra o lado controverso do músico de diversas formas, como quando toca no assunto da dificuldade em colaborar com Chorão, tido como um perfeccionista que não aceitava nada além do que idealizou. Outro ponto destacado pelo filme são as brigas, tanto com Marcelo Camelo, quanto com João Gordo; o líder do Ratos de Porão dá um grande depoimento, falando especialmente de como os dois fizeram as pazes - com Chorão percebendo que era hora de encerrar a inimizade.
Com pouco mais de 1h de duração, o filme acerta ao mostrar as contradições de Chorão. Em um dos momentos mais emocionantes, o músico conversa com uma fã do Charlie Brown Jr., que se desculpa por não ter dinheiro para ir aos shows e comprar CDs originais. E a contrapartida do vocalista diz para ela baixar as músicas e não gastar dinheiro com isso: “ame as pessoas e use as coisas”. Quantas pessoas da indústria da música falariam algo assim?
Mas esse era Chorão, que ao fim do filme se pinta como um homem mais sensível, que cantou seu amor por Graziela Gonçalves - que também marca presença no documentário - em várias músicas do Charlie Brown que embalaram os relacionamentos de jovens pelo país. O documentário foca menos no relacionamento dos dois, e o cita quando já está se encaminhando para o final. Para quem quiser se aprofundar mais no relacionamento, fica a dica do livro Se não eu, quem vai fazer você feliz? Minha história de amor com Chorão, que a própria Graziela assina falando sobre sua relação.
Chorão: Marginal Alado termina em um tom mais melancólico, deixando claro que toda a intensidade com a qual Chorão vivia também se refletiu de forma negativa, quando ele não conseguiu lidar com toda a pressão do mundo ao seu redor. Apesar disso, o documentário é o registro engrandecedor que os fãs do Charlie Brown Jr. merecem. Como dito no longa, Alexandre Magno Abrão não era um marginal por querer fazer as coisas erradas. Ele era marginal por decidir viver à margem da hipocrisia do mundo e escrever sua própria história. Sorte a nossa que ele conseguiu.