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Crítica

Como Seria Se... foca no amadurecimento e mostra o multiverso da felicidade

Deixando a comédia de lado, Wanuri Kahiu aborda a maternidade e a frustração profissional como temas principais

19.08.2022, às 11H06.

A moda das realidades paralelas deixou mesmo o cinema de fantasia e super-heróis e transpirou para outros gêneros, onde já aparecia esporadicamente, como nas comédias românticas sobre tomadas de decisão, a exemplo de De Caso com o Acaso (1998). O que surpreende em Como Seria Se... é a simplicidade da narrativa e como ela nos aproxima de realidades paralelas de um jeito sutil e pessoal. A comédia aqui fica para outro momento, e o amadurecimento se torna a estrela principal.

A trama fala de Natalie (Lili Reinhart, de Riverdale), uma jovem de 22 anos que está a poucos dias de se formar na faculdade, cheia de planos profissionais e pronta para aproveitar a vida - até que toda essa excitação resulta em uma noite de sexo casual com seu melhor amigo, Gabe (Danny Ramirez, de Top Gun: Maverick). Na noite de sua formatura, enjoada, ela decide fazer um teste de gravidez, e a partir daí o longa se divide em duas narrativas: uma em que o teste resulta em positivo, e outra em que Natalie nunca engravidou de Gabe e continua seguindo seus planos.

As histórias vão se desenrolando simultaneamente, alternando entre uma realidade e outra; o começo pode ser um pouco confuso, mas a sequência dos acontecimentos deixa a demarcação cada vez mais clara. Não demora para ficar visível que o que poderia ser uma comédia romântica, focada em interesses amorosos, desabrocha em conflitos mais complexos e reais. A diretora queniana Wanuri Kahiu (Rafiki) demonstra sempre um olhar muito sensível em seus projetos, e este não é exceção.

Natalie carrega muitos elementos emocionais como personagem, seja lutando para se adaptar à maternidade, ou para suprir suas próprias expectativas como profissional. Independente da versão da história que estamos seguindo, Wanuri sabe transmitir as dores e renúncias de sua personagem. A diretora faz questão de mostrar que nenhuma realidade é melhor que a outra, ou a certa a ser vivida: todas as escolhas e momentos experienciados pela personagem têm pontos altos e baixos, assim como a vida.

Sobre a maternidade, a roteirista estreante April Prosser lança uma visão sóbria e sem glamourização, escancarando principalmente a frustração. É possível perceber essa sensibilidade quando em um diálogo a mãe de Natalie, Tina (Andrea Savage), observando o sofrimento da filha, fala sobre o sentimento de luto na maternidade, um pesar pela pessoa que costumava ser, e como isso é pouco discutido. São escolhas como essa que elevam o roteiro do filme de uma simples história de encontros e desencontros para um drama mais assentado.

Não muito distante, o arco da outra Natalie correndo atrás do seu futuro profissional também é recheado de obstáculos e de fácil identificação, principalmente para os espectadores na casa dos 20 anos, recém-formados, que também anseiam por esse lugar de destaque profissional. Em meio aos desafios profissionais, Natalie conhece Jake (David Corenswet), um cara legal por quem se apaixona, demonstrando que não existe apenas um amor verdadeiro ou uma pessoa certa: por que cada vertente não pode ser uma possibilidade para a felicidade?

O elenco tem um bom desempenho e Lili Reinhart atende a responsabilidade de conduzir o filme, nos sentimentos de desilusão, estresse ou agonia de acordo com os tombos da vida. A direção de arte também é perspicaz ao utilizar o fato de Natalie ser desenhista para inserir ilustrações e cartoons quando deseja indicar passagem de tempo na trama, deixando o filme mais leve, apesar de todo o drama.

Em ambos os fios narrativos, o longa se preocupa em atingir um público amplo nos conflitos que aborda, enxergando nas escolhas da protagonista adversidades corriqueiras, tanto profissionais como pessoais e amorosas. O roteiro não segue pelo óbvio e nem utiliza de acontecimentos paralelos para justificar ou solucionar problemas em outro arco - cada história segue independente, mas culminando em estágios parecidos da vida. E costurar isso, sem usar clichês melodramáticos ou diálogos toscos e fantasiosos, é um deleite. A comédia aqui pouco se vê, mas não interfere na mensagem de que, independente de qual caminho seguir, o importante é ser feliz ao final.

Nota do Crítico
Bom