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Contágio | Crítica

Steven Soderbergh encara o apocalipse com um misto de olho clínico e alarmismo

27.10.2011, às 16H46.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H35

Quanto tempo dura um apocalipse? O cinema nos ensinou a aceitar o pós-apocalipse, o caos instalado, mas nem sempre acompanhamos o processo que leva à desordem. Às vezes nem os heróis do fim do mundo, como o Rick Grimes de Walking Dead ou Cillian Murphy em Extermínio, sabem o que aconteceu - o apocalipse transcorre sem resistência, inercialmente, como um grande coma induzido.

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A ideia de Contágio (Contagion), novo filme de Steven Soderbergh (Onze Homens e Um Segredo), é contar não apenas como o apocalipse se aproxima e se estabelece, mas acompanhar a reação do cidadão comum e das principais instâncias de poder do mundo diante do fim iminente. De certo modo, é como se Soderbergh refizesse a pirâmide de hierarquias e responsabilidades de Traffic, mas numa chave muito mais alarmista.

Germófobos vão entrar em êxtase com a pandemia de Contágio, que começa misteriosamente na Ásia, mata infectados em alguns dias e, semanas depois, está plenamente instalada em quatro continentes. São basicamente três esferas: o cidadão comum, representado pelos pais de família (Matt Damon, John Hawkes); as instituições públicas, concentradas nos médicos e epidemiologistas (Laurence Fishburne, Kate Winslet, Elliot Gould, Marion Cotillard); e, para fazer a ponte entre esses dois extremos, temos obviamente a mídia, na figura de um blogueiro e repórter investigativo (Jude Law).

O roteiro de Scott Z. Burns, autor de Ultimato Bourne que trabalhara com Soderbergh em O Desinformante, dá conta desses personagens de forma bem satisfatória. Não há cenas descartáveis, todos os momentos com esses protagonistas têm algo a acrescentar, e ao mesmo tempo o roteiro não é expositivo em excesso. Há um discurso moralista aqui e ali (contra o adultério, contra o capitalismo globalizado) e arroubos sentimentais (o contágio se dá pelo toque, então dar as mãos vira símbolo de humanismo), mas não comprometem.

A principal força de Contágio não está, porém, no roteiro, e sim na encenação. Soderbergh filma com enquadramentos "duros", de movimentos econômicos, e com a câmera à meia distância dos atores - um jeito aparentemente desapaixonado de encarar um tema tão dramático, mas esse estilo ajuda a dar ao filme um tom mais clínico. O distanciamento é uma boa forma, também, de valorizar os close-ups quando eles acontecem.

Há dois tipos de close-ups que fazem a diferença em Contágio. O primeiro são os planos-detalhes em maçanetas e em mãos que pousam sobre comidas e objetos. É essa opção de estilo que torna o filme tão eficiente como peça de alarmismo. E há os close-ups propriamente ditos, nos rostos de personagens atônitos com o que está acontecendo ao seu redor. São close-ups sem cortes rápidos, a duração um pouco mais longa dos planos permite ver mudanças de expressão, permite ver o pavor e o choque.

No fundo, é isso que Soderbergh tem interesse em filmar: como o início de um apocalipse se reflete no semblante das pessoas. A pandemia se espalha em progressão geométrica, o individual rapidamente desaparece na grande escala das coisas, mas são as pequenas perdas no meio do caos que ecoam mais.

 

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Nota do Crítico
Ótimo