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Contra o Tempo | Crítica

Ficção científica mascara erros conceituais com final elíptico

29.09.2011, às 19H20.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H45

Depois de Lunar, seu excelente e conciso primeiro longa-metragem, o filho de David Bowie, Duncan Jones, erra ao não corrigir a premissa básica de Contra o Tempo (Source Code).

Source Code

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Uma mistura de Minority Report e RoboCop com Feitiço do Tempo e Matrix, o filme apresenta um soldado (Jake Gyllenhaal) que faz parte de um programa experimental do governo para investigar um atentado terrorista. Ele desperta no corpo de um desconhecido, onde é forçado a viver e reviver uma angustiante explosão de trem até que consiga encontrar o responsável pelo atentado.

Jones é ótimo diretor e extrai boas atuações de seu elenco, sabe como criar tensão e mantém o filme - que se passa basicamente em apenas três ambientes - interessante e instigante até a metade. Mas aí percebe-se um erro fundamental no roteiro do estreante no cinema Ben Ripley que o filme tenta arrumar no terceiro ato. O personagem de Gyllenhaal está no corpo de uma das vítimas da explosão terrorista que vitimou dois trens de passageiros às portas de Chicago. É primeiro estabelecido no filme que a tecnologia criada para essa investigação do passado permite apenas que sejam revividos os últimos oito minutos da vida de qualquer pessoa de quem tenha sido obtida massa encefálica. Mas a seguir, na segunda passagem do soldado pelo trem, ele mesmo percebe que mudanças acontecem em relação à investigação anterior - ou seja, ele não está em uma fotografia, mas em um ambiente que responde aos novos estímulos.

Até aí, tudo bem. Todos esses conceitos provocantes não são novidade para qualquer pessoa que tenha assistido algum dos filmes citados acima - ou tantos outros projetos parecidos de ficção científica. O problema é que, em qualquer ambiente, dados não se criam. Pequenas mudanças seriam aceitáveis em função do conhecimento que a própria vítima tem daquelas pessoas do trem e da sua própria criatividade, mas quando o filme exige que você acredite que alguém pode invadir as memórias de um falecido e recriar, com precisão, fatos ocorridos que não foram vividos por aquela pessoa, temos um problema de coerência dos mais primários.

É como um programador me disse uma vez, ao se desculpar pelo bug de sistema que não fez o backup de uma semana de dados de um servidor: "lamento o ocorrido, mas não posso fazer nada... dados não registrados não se criam". O soldado, portanto, poderia ter fantasiado eventos a bordo do trem nos oito minutos de sua reencenação - mas quando sua fantasia corresponde aos fatos que efetivamente ocorreram (que chegam ao detalhamento de ele saber até a placa de um carro) não estamos mais em uma ficção científica, mas em uma fantasia - algo que o filme falha ao estabelecer previamente. O protagonista nunca foi precognitivo, mas apenas um soldado com uma missão.

A situação só piora no terceiro ato, quando Contra o Tempo parece tomar ciência da besteira fundamental de sua premissa - e parte para mascará-lo, "poetizando" o erro. Seguem-se então vários finais para desviar a atenção e buscar um looping misterioso - inspirado no desfecho de A Origem - para amarrar as falhas do texto e fingir que nada aconteceu, que tudo foi planejado (se ao menos o filme tivesse parado na bela cena congelada teria relação com o ótimo desfecho de Lunar).

Parece que ninguém da produção jogou os games da série Assassin's Creed - em que um efeito de tela luminosa, como um mosaico (curiosamente muito parecido com o de Contra o Tempo), impede que o protagonista - ele também um viajante de memórias - acesse regiões sobre as quais não tem dados gravados em seu DNA. E nem vou questionar aqui como o soldado tem o celular de sua oficial supervisora (Vera Farmiga, ótima). Minha suspensão de descrença já foi perdida lá atrás.

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Contra o Tempo | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Regular