No fim do ano passado, o cineasta George Miller (Happy Feet - O Pingüim) falou que Mel Gibson dificilmente voltaria para o quarto Mad Max porque o personagem exige muita energia, e que hoje o qüinquagenário astro está mais interessado no que acontece por trás das câmeras. Pode parecer um pouco precipitado dizer que a carreira de Gibson como ator acabou, mas é inegável que a sua paixão pelo cinema está maior do que nunca e que ela transborda em Apocalypto (2006), sua quarta aventura na cadeira de diretor.
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Na verdade, é até difícil imaginar Gibson sentado em qualquer cadeira, principalmente nos sets. Em todas as fotos e vídeos de divulgação ele está ao lado dos atores e equipe técnica conversando, explicando, correndo, se divertindo freneticamente. Até no meio do trailer ele aparece sorrindo, feliz da vida.
Não é para menos. Seu filme anterior, Paixão de Cristo (2004), foi tão controverso quanto bem sucedido nas bilheterias. E logo após mostrar a sua visão para as últimas horas da vida de Jesus Cristo, Gibson já procurava um novo projeto. Seu objetivo era fazer um filme de perseguição. Conseguiu e com louvor. Apocalypto é correria ininterrupta. Maratona para queniano nenhum botar defeito.
Logo na primeira cena já somos levados para uma caçada pela floresta. Com a presa devidamente capturada, vem o descanso, um respiro para apresentar os personagens (sempre em yucateco, a língua local) e dar algumas risadas. Pata de Jaguar (Rudy Youngblood) é um dos caçadores. Filho do líder da vila, ele fica atormentado com a visão de outros indígenas que tiveram sua tribo devastada e agora procuram um novo começo em outro lugar. O medo no olhar das pessoas é transferido para ele e se transforma em realidade quando guerreiros maias invadem o local onde mora atrás de escravas e prisioneiros. A destruição é generalizada e o sangue jorra sem miséria. Antes de ser capturado, Pata de Jaguar consegue proteger sua esposa, grávida, e filho. Serão eles que lhe darão forças para superar o medo e seus ferozes caçadores no longo caminho de volta para casa.
Um pouco de História para ajudar a história
Durante as pesquisas sobre o povo maia, Gibson descobriu alguns possíveis motivos que causaram a queda do império que dominou a região da América Central e se estendia do México a El Salvador. O consumismo, a devastação do meio-ambiente e a ganância por poder estão entre eles. Para construir prédios cada vez maiores, hectares de florestas eram derrubados. Sem as árvores, a lama corria para o pântano, diminuindo a qualidade do solo e gerando piores colheitas. Os reis, que acreditava-se ter um contato direto com os deuses, faziam oferendas, utilizando até mesmo humanos. E para manter sua mordomia, tributavam mais da população, que por sua vez ia se irritando mais e mais.
Este aspecto sócio-político fica nas entrelinhas. É a forma encontrada por Gibson para alertar sobre o risco que corremos. Segundo ele, se a sociedade atual não se cuidar, pode ter fim semelhante aos dos seus antepassados. Mas a verdade é que no meio de tanta correria pela selva, corações pulsantes sendo arrancados dos corpos e cabeças literalmente rolando, a mensagem passa batida por quem não tiver em mente as explicações acima.
Difícil é conseguir pensar no meio de tanta adrenalina. O mais comum é, nas pequenas pausas, fazer os olhos se manterem em alta velocidade, correndo cada centímetro da tela atrás dos detalhes de figurino, maquiagem e cenografia. Alguns historiadores vêem no filme equívocos alarmantes, mas a verdade é que Apocalypto se preocupa mais com a diversão, deixando a reflexão como dever de casa.