Arquétipos baseados nos clássicos gregos, jornada do herói, situações conhecidas e mais que revisitadas em todas as mídias. A Lenda dos Guardiões (Legend of the Guardians: The Owls of Ga'Hoole, 2010) é mais um filme a empregar essas estruturas em uma aventura infanto-juvenil.
A Lenda dos Guardiões
A Lenda dos Guardiões
A Lenda dos Guardiões
Nada de novo, portanto, na história da corujinha Soren, que cresceu ouvindo histórias de grande batalhas das corujas, em que os Guardiões de Ga´Hoole enfrentaram e derrotaram o exército dos "Puros". Na trama, quando Soren é sequestrado e descobre que a ameaça que se julgava exterminada está de volta, ele deve procurar a ajuda dos lendários Guardiões e encontrar forças para tornar-se um dos heróis que cresceu admirando.
Dentro dessa lógica, a Lenda dos Guardiões tem um pouco de Harry Potter e muito de Star Wars (só pra ficar em dois exemplos mais imediatos). Não dá pra não pensar no velho Ezylryb como um "Obi-Wan-Coruja", já que o velho guerreiro aposentado treina Soren Skywalker nas artes do combate elegante. Sai a "Força", entra a "Moela".
O roteiro de John Orloff (O Preço da Coragem) e John Collee (Mestre dos Mares), com base na série de livros infantis de Kathryn Lasky, limita-se, portanto, a entregar todos os requisitos esperados de uma aventura épica para o público jovem. Enquanto isso, coube à Animal Logic, que já havia trabalhado com as produtoras Village Roadshow e Warner Bros. em Happy Feet, as surpresas.
O visual criado pela empresa australiana através de computação gráfica é magnífico. Na entrada da pré-estreia, a WB brasileira colocou corujas de verdade para que as crianças pudessem interagir com os animais. Pois o filme parece um retrato live-action daqueles mesmos bichos de tão realista. Cada pena é destacada das demais, move-se individualmente, libera partículas quando roçada... não é simplesmente uma textura de penas aplicada ao elemento.
Além disso, a animação de personagens não aposta no antropomorfismo para resolvê-los, o que deve ter dificultado - e muito - o trabalho da equipe. As corujas e animais movem-se como corujas de verdade (não usam as asas como mãos e dedos, como é comum em animações com aves). As licenças poéticas são centradas mais nas caras e bicos, que emulam expressões mais humanas, o que vira até piada em determinada cena, com dois vilões experimentando suas caretas.
A trama bem amarrada e o visual impressionante podem ser acompanhados ainda do 3D estereoscópico, já que o filme chegou com essa opção às telas. Mas não há grande diferença entre o 2D e o 3D. Ainda que bem realizada, em certos momentos a versão tridimensional fica meio desfocada. Em outros, melhora a ação - como na cena do grande tornado.
Trata-se de um projeto inusitado para o cineasta, considerando sua cinematografia, e Zack Snyder, diretor conhecido por levar às telas as histórias em quadrinhos 300 e Watchmen, fez um bom trabalho dirigindo A Lenda dos Guardiões à distância (ele aprovou tudo no Canadá, filmando Sucker Punch, através de videoconferência com a Austrália). Quando conversamos durante a produção ele contou que estava feliz porque "pela primeira vez meus filhos poderão assistir a um filme meu".
O problema é que Snyder parece um pouco desconectado do que as crianças estão gostando hoje em dia. O filme não tem humor (os alívios cômicos são quase nulos) e o tom épico é exagerado, assim como a violência. Não há sangue, claro, mas as situações de combate são bastante incisivas. Já as emoções - que atrairiam os adultos, a la Pixar - são superficiais (acredita-se no exército de corujas, mas não na transformação do irmão de Soren). Não há muito como errar seguindo estruturas de história tão antigas quanto a linguagem escrita e usando técnicas de ponta de animação, mas dá, sim, pra se equivocar dirigindo o filme a um determinado público e não fazer concessões sobre seus gostos e preferências para se adequar. Os fãs do cineasta e de técnicas de CGI devem apreciar A Lenda dos Guardiões, mas não diria o mesmo de seus filhos.