Na última década e meia os épicos campais não só voltaram a se estabelecer no cinema, como seguem um formato de mise-en-scéne bem definido: aérea de batalhões, tomadas de grua enfocando generais de baixo para cima, close-ups na hora do discurso de incentivo. Pode parecer espantoso que a indústria do Cazaquistão consiga produzir um competente longa desse gênero, mas o fato é que os modelos são facilmente imitáveis - de O Senhor dos Anéis a 300.
mongol
mongol
Dito isso, O Guerreiro Genghis Khan (Mongol, 2007) tem - entre genéricas sequências de ação, filmadas a contento, com atenção especial às armas e às vestes dos guerreiros - alguns elementos muito particulares. Finalista cazaque ao Oscar de melhor filme estrangeiro, o trabalho do diretor Sergei Bodrov não só repassa um momento definidor da história da antiga Mongólia como ilustra bem a atual situação do ex-império, que já teve o maior exército da Eurásia e hoje sobrevive afunilado entre a influência da Rússia e da China.
Acompanhamos a história de Temüjin (Tadanobu Asano, de Zatoichi), a partir de seu nascimento nas estepes em 1192. Filho do khan (líder) local, Temüjin precisa aprender cedo a sobreviver sozinho, depois que o pai é envenenado e traído pelos seus comandados. Formando aliados e fazendo inimigos, perdendo e ganhando batalhas, Temüjin se torna, 20 anos depois, um líder tribal capaz de rivalizar com o império chinês que se alastra sobre território mongol.
O filme só associa o nome de Temüjin ao epíteto que o tornou famoso - genghis khan, o grande líder - no final, um favor que o título em português já faz logo de cara. Na sua missão de unificar os mongóis, Genghis Khan foi visto por muitos como um terrível aniquilador de adversários, um dos maiores genocidas da história do mundo. Bodrov, do seu lado, traça um retrato simpático do mito - a começar pela própria opção de narrar a primeira fase de sua vida, antes da chegada ao poder.
Assim, nas telas, Temüjin surge quase como um messias misericordioso: adotando filhos que não são seus, perdoando rivais, associando-se com os deuses. O espírito unificador fala diretamente ao público de hoje, tentando mostrar um líder magnânimo e até mesmo humanista. Ao mesmo tempo, quando destaca o talento de Temüjin como estrategista de guerra, o filme tenta despertar nos cazaques uma memória de vitória, de tempos expansionistas em que fazer guerra não era um crime, mas uma forma de reafirmação pátria.
Não por acaso, esta co-produção russa e cazaque (com consultoria dos membros da Academia de Ciências da Rússia, como dizem os créditos final) termina dando uma alfinetada na forma como a China tratou seus monges budistas ao longo dos séculos. Mais do que uma obra de propaganda, O Guerreiro Genghis Khan surge para mostrar ao mundo - e à China - que um dia o Cazaquistão foi muito mais do que, meramente, o país do Borat.
Saiba onde o filme está passando