Há muito tempo a TV deixou de ser uma tela pequena, a qual se destinavam obras menos complexas e com menor valor de produção. Se a HBO comprova isso desde Oz e Os Sopranos, os serviços de streaming ampliaram esse conceito para além das narrativas seriadas, tirando do papel filmes pouco comerciais como Roma e O Irlandês. É uma pena, então, que mesmo sendo produzido pelo Amazon Studios, a adaptação de John Crowley para O Pintassilgo (The Goldfinch) tenha seguido uma rota tão tradicional.
As mais de 700 páginas do romance de Donna Tartt são condensadas ao longo de 149 minutos, privando a história de Theo Decker (Ansel Elgort/Oakes Fegley) de todas as suas nuances. Aos 13, ele sobrevive a um atentado à bomba em um museu, mas perde a mãe. Em meio à destruição, Theo salva O Pintassilgo, a pintura de Carel Fabritius que se transforma em um vínculo com aquele momento trágico.
Acontece que o roteiro de Peter Straughan não dá conta de representar a complexidade de Theo e a completa solidão que faz com que esconda por anos o quadro do pássaro acorrentado. Os dois períodos de tempo em que a adaptação é situada parecem desconexos, sem espaço para que nenhum dos momentos tenha o desenvolvimento necessário. A sensação é de que sempre há muito para ser dito, mas tudo não passa do conceito, sem chegar à realização.
Quando troca Nova York por Las Vegas, O Pintassilgo encontra a sua melhor forma. Depois de passar um tempo com a abastada família de um amigo de infância, representada pela matriarca vivida por Nicole Kidman (uma versão condensada de vários personagens do livro), Theo é condenado a viver com o pai até então ausente (Luke Wilson) e a madrasta Xandra (Sarah Paulson, aproveitando cada segundo na pele de uma “real housewive”). É lá que ele conhece Boris (Finn Wolfhard), um pálido e sensível ucraniano com acesso à drogas. Pelo esforço dos jovens atores, as desventuras de Theo e Boris formam a relação mais consistente de todas que o filme tenta construir.
É nesse período também que a fotografia de Roger Deakins é melhor aproveitada, usando luz e enquadramento para transformar a amizade dos garotos em uma pintura cuja contemplação amplia o seu significado. A edição, porém, na urgência de seguir adiante, não desfruta a totalidade desses momentos, tornando o longa carente de todos os sentimentos que pretende evocar. Para um filme que tem como objeto central uma obra de arte, falta apreço pela observação.
Mesmo entre boas intenções técnicas e estéticas, com um sólido trabalho do seu elenco, O Pintassilgo é mais resumo do que adaptação. Fosse uma minissérie, ou mesmo se tivesse ido além das 2 horas e 29 minutos, talvez essa não fosse uma experiência tão frustrante, ainda presa à ideia da tela grande, mas sem entregar grandiosidade.