Filmes

Crítica

Crítica: Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo

Adaptação dos games respeita ideias da série, mas se confunde com elas

03.06.2010, às 17H02.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 14H03

As adaptações de videogames para o cinema sofrem do mesmo mal que acometeu (e eventualmente ainda acomete) os filmes de histórias em quadrinhos: direcionamento equivocado de profissionais que não conhecem o material-base suficientemente bem para entendê-lo e extrair dele seus pontos mais fortes e mitologia. O que Hollywood enxerga ao licenciar esses produtos é apenas a base de fãs estabelecida, personagens e cenários prontos e o valor da marca.

Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo

Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo

Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo

Felizmente, depois que séries excelentes nos games geraram filmes medíocres e sem grande expressão em bilheteria, as coisas começaram a mudar. Paralelamente, editoras, distribuidoras e desenvolvedoras de games começaram a ficar tão grandes, ou maiores, que alguns estúdios de cinema. O resultado são negociações muito mais cuidadosas de marcas como Prince of Persia, que está chegando aos cinemas com o "pedigree" da Walt Disney Pictures, através da empresa de Jerry Bruckheimer e com o criador Jordan Mechner a bordo do projeto. A intenção era transformar a aventura egressa dos jogos eletrônicos no novo Piratas do Caribe, a mais lucrativa série cinematográfica do superprodutor e estúdio.

O resultado, Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo (Prince of Persia: The Sands of Time), não esconde esses esforços. É tudo superlativo, épico, grandioso... os efeitos especiais e os valores de produção - a direção de fotografia de John Seale é primorosa! - são de primeira, exatamente o esperado de um orçamento de 200 milhões de dólares. Mais do que isso, ao entregar a direção a Mike Newell (Harry Potter e o Cálice de Fogo, Amor nos Tempos do Cólera) os produtores já haviam de certa forma deixado claro seu interesse em fazer algo que fosse além do "blockbuster da semana", pela linha menos pirotécnica e mais romântica do cineasta.

A história segue ideias do game homônimo de 2003. Nela, Nizam (Ben Kingsley) arma o assassinato de seu irmão, Shahrman, o soberano de Pérsia, e bota a culpa no príncipe Dastan (Jake Gyllenhaal) para poder assumir o trono. Banido, Dastan tem que relutantemente juntar forças com uma bela e misteriosa princesa Tamina (Gemma Arterton) para guardar uma adaga ancestral capaz de conjurar as areias do tempo - um presente dos deuses que pode fazer voltar o tempo e dar ao seu mestre o controle do mundo.

A trama aventuresca é feliz ao adaptar para as telonas algumas das maiores qualidades da série de games. Desde o primeiro Prince of Persia (1989), a movimentação fluida do protagonista, as armadilhas e quebra-cabeças são elementos consagrados desses games. No filme, Dastan move-se como sua contraparte digital e conta com o auxílio de técnicas de parkour para ricochetear e macaquear através dos telhados e paredes das cidades persas. Há também algumas sequências em que o príncipe precisa usar seu raciocínio rápido e habilidades para resolver urgências - como o momento em que derruba um caldeirão de óleo para impedir que o exército inimigo avance sobre o do seu irmão. Para os fãs dos games e o público em geral, tratam-se de cenas agradáveis de acompanhar, ricas em detalhes e aventura.

O grande problema do filme é a escolha do protagonista. Para viver o persa Dastan foi contratado o angelino Jake Gyllenhaal (O Segredo de Brokeback Mountain, Zodíaco). Gyllenhaal se esforça, mas tem uma certa fragilidade lânguida no olhar que não convence muito como herói de ação. Ele quer ser o Ladrão de Bagdá de Douglas Fairbanks, mas fica mais para o Sheik de Rodolfo Valentino. Ou seja, a personagem de Gemma Arterton parece mais durona que Dastan e seus músculos torneados...

A produção se descontrola ainda no último ato, que se arrasta demais e não sabe como resolver direito os poderes da adaga do tempo. Todo o desfecho é atropelado e a ideia do retorno ao passado (o rebobinamento do filme) fica jogada sem muita lógica. Afinal, se o artefato é tão poderoso e Dastan era contra a invasão da cidade sagrada por que não o segurou mais alguns instantes para impedir o derramamento de sangue?

É curiosa também - e um tanto desnecessária - a metáfora com a Guerra do Iraque que o longa apresenta no começo. O irmão de Dastan invade uma cidade sagrada em busca de armas que, mais tarde, descobrimos não existir. A produção faz assim um mea culpa Era Obama visando agradar as audiências internacionais. Ao mesmo tempo segue com a eterna solução de colocar caucasianos para viver etnias diversas (todos os persas são vividos por norte-americanos ou ingleses e para dar um ar "exótico" à produção falam com uma inexplicável ponta de sotaque britânico). Não dava pra ficar mais bipolar que isso...  mas ao menos é um bipolar bonito e cheio de ação.

Nota do Crítico
Bom