Mesmo para quem usa como critério para diferenciar um carro do outro apenas a cor ou o número da placa, sem fazer qualquer distinção entre modelos e marcas, um Delorean não deve passar despercebido. Imortalizado como máquina do tempo na franquia De Volta Para o Futuro, o veículo se tornou ícone da cultura pop, identificado mesmo por quem não faz questão de entender sobre automóveis. Reconhecimento era o desejo do seu criador, John Delorean, mas não exatamente dessa maneira.
Driven narra a história de ascensão e queda do carro nascido dos sonhos de um gênio da engenharia e enterrado pela sua própria ganância. Depois de anos trabalhando para outras montadoras, John Delorean (Lee Pace) queria seu nome imortalizado em um veículo que revolucionaria a indústria. Apostou tudo para criar a própria marca, incluindo a sua reputação: desesperado para salvar a empresa, Delorean buscou a ajuda do seu vizinho com contatos no narcotráfico para importar US$ 25 milhões em cocaína.
Jim Hoffman (Jason Sudeikis), o vizinho em questão, é o dono no ponto de vista no longa dirigido por Nick Hamm. A narrativa segue a sua ótica dos fatos, desde a prisão em flagrante que o transformou em informante do FBI. É uma escolha que investe no lado pitoresco dessa história para ganhar ares de comédia. Sudeikis garante o humor do personagem, mas vai além da piada. Seu personagem é um cretino adorável, caráter duvidoso que o ator vende por completo. Das interações entre Jim e o sério agente Benedict Tisa (Corey Stoll), o filme tem alguns dos seus melhores momentos. O contraste entre os dois ressalta suas personalidades e o timing entre as atuações é perfeito. Judy Greer, a esposa de Jim, é outro acerto no elenco, que além de contribuir para estabelecer a persona colorida do piloto/traficante/informante/pai de família, tem chance de eventualmente roubar a cena.
Ainda que o tom seja cômico, o roteiro de Colin Bateman ri dos fatos, não dos envolvidos, o que garante certo grau de empatia, por mais moralmente condenáveis que sejam algumas atitudes. Nesse sentindo, a atuação de Pace como Delorean destoa do conjunto. Na balança entre excêntrico e caricatural, o ator pende para o segundo, dando um ar pouco genuíno ao personagem - fato agravado pela comparação entre a sua imagem e o verdadeiro Delorean nos créditos finais. A trilha sonora, mais playlist do que complemento de cena, também prejudica a autenticidade da representação dos eventos, culminando em um clima geral de reconstituição para a TV.
A montagem ágil de Brett M. Reed, contudo, dá ritmo e tensão ao longa, mantendo espaço para a entrega de fatos históricos e o tempo da comédia. Com 1h48, o filme passa rapidamente, correspondendo a velocidade com que o Delorean DMC-12 entrou e saiu de produção. Carismático da primeira à última cena, Driven é a prova que o apelo cinematográfico do “carro com asas” vai além das aventuras de Doc Brown e Marty McFly. Essa é a história bizarra de um sonho que virou piada.