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Elle | Critica

Sexo, poder e videogame no feminismo de Paul Verhoeven

10.09.2016, às 22H35.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Paul Verhoeven possivelmente encontrou em Isabelle Huppert o veículo perfeito para sua visão de mundo. Em seu primeiro filme em francês, Elle, o provocativo diretor holandês deixa nos ombros da atriz parisiense a responsabilidade por tornar possível um roteiro que deve causar polêmica entre certos grupos feministas.

O filme, afinal, abre com a brutal cena do estupro da protagonista. Poderosa proprietária de uma desenvolvedora de games, Michelle (Huppert) é violentada em sua própria casa. No entanto, o evento parece apimentar nela suas fantasias eróticas, além dos esperados sentimentos de vingança.

A princípio tal premissa parece extremamente ofensiva, algo contrário a todo o empoderamento feminino pelo qual batalha-se hoje. Mas Verhoeven é um mestre como poucos... e da sua aliança com Ruppert sai um filme memorável.

Dessa ideia controversa ergue-se uma heroína formidável. Da brutalidade e humilhação não brota uma mulher vingativa - este não é Kill Bill - mas alguém que, ainda que se sinta ofendida, usa sua nova realidade para fazer mudanças. Ao ver-se privada de seus direitos, a protagonista se enrijece em sua determinação por controle, e fica mais feminina no processo.

O fato de ela ser uma desenvolvedora de games não é gratuito. Enquanto enfrenta seus próprios demônios - um filho imbecil, uma mãe prestes a embarcar em um casamento de conveniência, um amante carente e, por último, um pai assassino serial -, Michelle lidera na empresa uma equipe completamente masculina, em um meio essencialmente machista. E a história que é contada no jogo, pelos cantos do filme, reflete a própria transformação da heroína.

O roteiro de Verhoeven e a atuação da francesa são tão bons que em momento algum, porém, isso parece uma jornada de redescoberta ou coisa assim. Michelle não foi forçada a mudar pelo ocorrido. Ela domina todas as suas escolhas - da primeira à última do filme. O estupro foi um infortúnio, que ela dobra e consome sua energia, como num inimigo derrotado nos games.

Baseado no romance Oh..., de 2012, de Philippe Djian, Elle é preciso, incisivo e cuidadosamente costurado, com doses equilibradas de humor negro e sarcasmo que Ruppert entrega intensamente. É Verhoeven em um dos melhores momentos de sua brilhante carreira.

Nota do Crítico
Excelente!