Encounter é um filme que está sempre mudando de marcha. O diretor Michael Pearce (Beast), que também assina o roteiro ao lado de Joe Barton (O Ritual), criou um longa peculiar, que começa como uma ficção científica com toques de horror corporal perturbadores. A abertura, toda feita de closes de microorganismos alienígenas penetrando uma versão do corpo humano reimaginada como uma paisagem infernal sob tempestade de relâmpagos permanente, estabelece o tom sofisticado e tenso que Pearce usa sempre que precisa voltar a essa versão da sua história.
Essas cenas são imbuídas de uma segurança diretiva inegável, usando a trilha sonora de ruídos bruscos e agudos criada por Jed Kurzel e a fotografia atenta a truques de iluminação de Benjamin Kracun para causar um incômodo quase instintivo no espectador. Mas Encounter nem sempre quer ser esse filme, ou ao menos não quer ser só esse filme - a notícia boa, nesse caso, é que Pearce e seus colaboradores aplicam cada uma das reviravoltas do texto, cada uma das mudanças de ritmo, emoção e significado, com sensibilidade irrepreensível.
A história, no máximo que se pode descrevê-la sem maiores spoilers, acompanha o ex-militar Malik Khan (Riz Ahmed), que um dia aparece na casa da ex-mulher e leva os dois filhos, Jay (Lucian River-Chauhan) e Bobby (Aditya Geddada), em uma viagem improvisada pelo interior dos EUA. Malik está convencido de que um parasita alienígena chegou à Terra através de meteoros, e que ele transforma seus hospedeiros em indivíduos violentos quando toma posse deles.
Encounter está o tempo todo brincando com a nossa perspectiva, com o que vemos e sabemos quando somos colocados no lugar desse ou daquele personagem na narrativa. Lidar bem com essa brincadeira é essencial para o filme, porque é justamente ao centrar determinados personagens em determinados momentos, como a assistente social vivida por Octavia Spencer ou o filho mais velho de Malik, Jay, que Encounter encontra o eixo no qual pode equilibrar o seu tom em constante transformação.
Assim, enquanto passa por considerações sociais importantes, incluindo uma perspectiva racial que não deve ser ignorada (a identidade de Malik como um homem não-branco nos EUA é importante para vários momentos da trama), e também a possibilidade de toda a sua elaboração de gênero ser meramente uma distorção psíquica do protagonista, Encounter nunca perde o investimento emocional e intelectual do espectador.
É verdade que, lá pelas tantas, o roteiro de Pearce e Barton parece reconhecer que se colocou em uma espécie de beco sem saída, e por isso parte do último ato de Encounter não consegue evitar aquela sensação de truncamento e afobação. Aí quem entra em cena para salvar o dia é a dupla central formada por Riz Ahmed e Lucian River-Chauhan - o indicado ao Oscar e o ator mirim canadense entregam duas performances ricas em subtexto e delicadeza, que funcionam ainda melhor juntas do que separadas.
Na tensão elemental entre eles, Encounter encontra a cola que segura suas muitas versões juntas em um todo não só coerente, como verdadeiramente tocante.