Riz Ahmed em cena de Encounter (Reprodução)

Filmes

Crítica

Encounter mistura horror corporal, social e psicológico em receita envolvente

Riz Ahmed e ator mirim Lucian-River Chauhan elevam momentos mais afobados do filme

10.12.2021, às 06H00.
Atualizada em 28.02.2024, ÀS 00H47

Encounter é um filme que está sempre mudando de marcha. O diretor Michael Pearce (Beast), que também assina o roteiro ao lado de Joe Barton (O Ritual), criou um longa peculiar, que começa como uma ficção científica com toques de horror corporal perturbadores. A abertura, toda feita de closes de microorganismos alienígenas penetrando uma versão do corpo humano reimaginada como uma paisagem infernal sob tempestade de relâmpagos permanente, estabelece o tom sofisticado e tenso que Pearce usa sempre que precisa voltar a essa versão da sua história.

Essas cenas são imbuídas de uma segurança diretiva inegável, usando a trilha sonora de ruídos bruscos e agudos criada por Jed Kurzel e a fotografia atenta a truques de iluminação de Benjamin Kracun para causar um incômodo quase instintivo no espectador. Mas Encounter nem sempre quer ser esse filme, ou ao menos não quer ser esse filme - a notícia boa, nesse caso, é que Pearce e seus colaboradores aplicam cada uma das reviravoltas do texto, cada uma das mudanças de ritmo, emoção e significado, com sensibilidade irrepreensível.

A história, no máximo que se pode descrevê-la sem maiores spoilers, acompanha o ex-militar Malik Khan (Riz Ahmed), que um dia aparece na casa da ex-mulher e leva os dois filhos, Jay (Lucian River-Chauhan) e Bobby (Aditya Geddada), em uma viagem improvisada pelo interior dos EUA. Malik está convencido de que um parasita alienígena chegou à Terra através de meteoros, e que ele transforma seus hospedeiros em indivíduos violentos quando toma posse deles.

Encounter está o tempo todo brincando com a nossa perspectiva, com o que vemos e sabemos quando somos colocados no lugar desse ou daquele personagem na narrativa. Lidar bem com essa brincadeira é essencial para o filme, porque é justamente ao centrar determinados personagens em determinados momentos, como a assistente social vivida por Octavia Spencer ou o filho mais velho de Malik, Jay, que Encounter encontra o eixo no qual pode equilibrar o seu tom em constante transformação. 

Assim, enquanto passa por considerações sociais importantes, incluindo uma perspectiva racial que não deve ser ignorada (a identidade de Malik como um homem não-branco nos EUA é importante para vários momentos da trama), e também a possibilidade de toda a sua elaboração de gênero ser meramente uma distorção psíquica do protagonista, Encounter nunca perde o investimento emocional e intelectual do espectador.

É verdade que, lá pelas tantas, o roteiro de Pearce e Barton parece reconhecer que se colocou em uma espécie de beco sem saída, e por isso parte do último ato de Encounter não consegue evitar aquela sensação de truncamento e afobação. Aí quem entra em cena para salvar o dia é a dupla central formada por Riz Ahmed e Lucian River-Chauhan - o indicado ao Oscar e o ator mirim canadense entregam duas performances ricas em subtexto e delicadeza, que funcionam ainda melhor juntas do que separadas.

Na tensão elemental entre eles, Encounter encontra a cola que segura suas muitas versões juntas em um todo não só coerente, como verdadeiramente tocante.

Nota do Crítico
Ótimo