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Crítica

Febre Ondulante | Crítica

Forte e cuidadoso, filme japonês trata do desejo feminino como algo a preservar

06.10.2015, às 11H15.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Febre Ondulante (Umi Wo Kanjiru Toki, 2014), adaptação ao cinema do romance de Kei Nakazawa, começa com um casal visitando um zoológico, quando é pego por um temporal. De volta à casa, nus e molhados, Emiko (Yui Ichikawa) e Yo (Sosuke Ikematsu) dividem confidências, transam - fazem jus, enfim, ao título do filme de Hiroshi Ando.

Mas essa primeira relação, com sua carga erotizada, encenada lentamente por Ando, não se repetirá depois. Descobrimos que o filme se divide em dois, o antes e o depois da vida do casal, e o sexo traz consigo outros sentimentos, nem sempre nobres. De colegial apaixonada nos flashbacks, implorando pelo amor de Yo, Emiko se torna no presente uma sombra daquele seu passado, embora tenha mantido com Yo um relacionamento que ele nutre visitando-a com frequência.

Das coisas que se perdem nesse processo, que envolve as particularidades da cultura japonesa, principalmente o servilismo que se exige das mulheres na vida adulta, nada é mais pungente do que a perda da inocência de Emiko. Embora Ando encene a primeira aproximação do jovem casal num cenário abismal, o jornal do colégio cheio de prateleiras com papéis velhos, para Emiko esse espaço tem a sacralidade do primeiro amor, mesmo que Yo junte dois bancos marrons certamente desconfortáveis para que eles se deitem.

A luta ao longo de Febre Ondulante - um filme difícil feito de planos estáticos, em que o cenário conta a história mais do que os diálogos - parece ser menos por uma justiça social que reconheça os anseios de Emiko e mais pela preservação do seu desejo, que ao longo do filme tende a se perder em culpa, responsabilidades, rotinas. Existe algo de sacro não apenas no desejo feminino, que Ando tenta dramaticamente reter, mas principalmente no corpo feminino, que ele encena com sutis e respeitosas sugestões eróticas, como na cena do banho.

É muito bonito o momento em que Emiko cede, no fim, e termina fumando o cigarro que ficou segurando antes, o que desperta lembranças de uma vida acomodada que ela negou para si. Se Febre Ondulante se faz nesses pequenos gestos e na ambientação - e é definitivo o momento em que a câmera se move finalmente, primeiro na cena do banho e depois com a câmera na mão na cena da praia, como uma libertação - é em função desse respeito pela mulher e seu espaço, sua intimidade.

Nota do Crítico
Ótimo