A Fera | Crítica

A Fera (Beastly, 2010) é exemplo claro da desconexão de alguns produtores de Hollywood com o "mundo lá fora". Aproveitando a lucrativa onda que mistura romance adolescente e o sobrenatural, em que o expoente máximo é a Saga Crepúsculo, realizaram um resgate do conto do século 18 A Bela e a Fera. A premissa era simples: dar à história já testada e aprovada ao longo de séculos uma roupagem moderninha, teen colegial, com astros do momento e embalar tudo com uma trilha "de jovem". O problema é a ignorância do filme do que é efetivamente uma "fera" hoje em dia.

No mundo de aparências do filme, a transformação do arrogante garoto Kyle Kingston (Alex Pettyfer), alguém que, como o príncipe da fábula, precisa aprender uma lição, não é em monstro abominável, mas em alguém com visual que remete ao punk. Ele fica careca, ganha piercings, tatuagens e algumas cicatrizes - a ideia dos velhos produtores de uma aberração. Ora, não precisa ir muito longe em qualquer cidade grande do mundo para encontrar visuais bastante próximos ao do amaldiçoado Kyle.

Seguindo a narrativa do conto, o príncipe, aqui filho de um apresentador milionário de televisão, precisa encontrar o amor em um ano, ou ficará daquele jeito para sempre. A maldição é cortesia da bruxa adolescente gótica Kendra (Mary-Kate Olsen, bizarra, uma Lady Gaga piorada), que parece ter ignorado que basta que o recém-criado monstro frequente os mesmos clubes que ela durante algumas semanas para encontrar sua alma-gêmea.

Banido para a casa de campo da família, Kyle terá que se virar com seus novos serventes, o mentor cego Will (Neil Patrick Harris, o único razoavelmente preocupado em atuar no filme, ainda que igual a todos os seus outros papeis) e a governanta Zola (Lisa Gay Hamilton). Não tarda para que surja a "Bela" da história, aqui na figura agradável, mas de qualidade abismal como atriz, de Vanessa Hudgens. Seguem-se as epifanias esperadas, as lições aprendidas, as frases feitas etc.

Assim, o diretor e roteirista Daniel Barnz comete um desserviço tremendo, ignorando o real significado da fábula e entregando um filme que é tão segregatório de quem quer ser diferente do que a versão bonitinha, a prévia e "maligna", de seu protagonista. E como se não bastasse a desconexão e a burrice no design, de cinema ele também não entende coisa alguma. Note como em determinado momento, um dos personagens diz "estou apaixonado", ou coisa assim, e sobe a música, evidenciando, porcamente, a não-atuação do protagonista, com a mesma frase repetindo a declaração. Usar a linguagem do cinema em favor da narrativa, pra quê? Até que Barnz é bom em criar atmosfera (a casa e ambientes são bem construídos), mas é muito pouco para justificar essa sandice.

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