Não saber nada sobre História de um Casamento (Marriage Story) é a melhor forma de assistir ao filme de Noah Baumbach na Netflix. Logo, esse é um texto para ser guardado, um amigo para conversar depois.
E esse é um filme que pede uma conversa depois de ser visto. Não só pela sua qualidade, com um roteiro sensível, bem atuado e precisamente captado pelo diretor de fotografia Robbie Ryan, mas pela acuidade com que trata do tema escolhido. Baumbach fala de casamento e separação com a mesma intensidade porque entende o amor como a base das duas coisas.
“Vou amá-lo para sempre, mesmo que não faça sentido”, escreve Nicole (Scarlett Johansson) no exercício terapêutico que ela se recusa a ler para Charlie (Adam Driver). Um divórcio não é necessariamente o fim de um sentimento, mas a sua transformação. É por isso que História de um Casamento começa com declarações de amor para logo depois revelar a separação. A partir daí a câmera acompanha Johansson e Driver na metamorfose desse relacionamento e exige a completa entrega dos atores. Baumbach evita cortes, levando as cenas para além da zona de conforto, seja em uma discussão em que o impensável é dito, seja no discurso da advogada (Laura Dern) — enquanto Maria é a mãe perfeita, uma virgem, ninguém espera nada dos homens, explica, porque até Deus é um pai ausente.
Essa falta do controle do corte — que manipula o que deve ser visto — é essencial para o desenvolvimento do filme. Enquanto o lado racional de Nicole e Charlie clamava por uma separação amigável, a realidade é outra. Se um casamento exige comprometimento, um divórcio é a sua negação. Anos de negligência inconsciente e seu consequente ressentimento falam mais alto. Nicole quer ficar em Los Angeles, Charlie está feliz em Nova York, os dois tem um filho e aí começam os problemas.
Além de Dern, Ray Liotta e Alan Alda formam a frente de intermediários que, cada um à sua maneira, busca um acordo entre um casal que nunca soube conversar — ela não sabia dizer o que queria, ele não questionava o que não lhe interessava. Entre eles, o filho vira uma demarcação de território, uma vitória a ser conquistada, e o amor se torna ódio.
A chegada em um consenso exige o mesmo comprometimento do casamento. É preciso ceder para que o que foi amor e virou ódio volte a ser amor, mesmo que não faça sentido — mesmo que o espectador romântico busque por uma solução em que o casal permaneça junto. O final feliz é um pouco mais complicado.