Cena de Horizon: An American Saga - Chapter 1 (Reprodução)

Filmes

Crítica

Horizon é uma história de colonização sobre a tragédia do colonizador

Kevin Costner sente tanta falta do clássico que faz filme insosso e regressivo

20.05.2024, às 15H58.
Atualizada em 20.05.2024, ÀS 20H33

Lá pela metade de Horizon: An American Saga - Chapter 1, dois colonos que estão tentando se estabelecer em uma região remota do Oeste estadunidense em meados do século XIX conversam sobre como seus sonhos estão ao alcance e como finalmente se sentem seguros nesse novo país - e Kevin Costner corta imediatamente para a figura em silhueta de um nativo-americano em seu cavalo, observando do alto de uma montanha a caravana passando abaixo, enquanto a trilha de John Debney (A Paixão de Cristo) sobe em uma nota grave ameaçadora. Muito se tem falado, desde a estreia de Horizon no Festival de Cannes 2024, sobre como o filme é confuso e esteticamente apagado, mas talvez devêssemos falar um pouco mais sobre o quão regressivo ele também é.

Ao lado do seu co-roteirista, o novelista Jon Baird, Costner cria um épico tão ansioso para resgatar os chavões e tradições do faroeste clássico que esse impulso classicista transborda em uma simplificação moral grosseira - índios são bandidos, caubóis são heróis; índios matam colonos de bom coração, iniciando um conflito que vai levar ao seu extermínio; índios queimam aldeias, destruindo o sonho daqueles que vieram de longe pela promessa de uma “nova” terra (que nunca foi deles para ocupar). Fosse mais equilibrado em sua leitura do trágico ciclo de violência do Velho Oeste, talvez Horizon ainda se passasse por uma visão “sombria e realista” desse período, mas nem esse é o caso. Só um lado do Oeste sofre diante da câmera de Costner, fazendo pose de herói diante dos ângulos rebaixados e do Sol a pino das planícies americanas - ao outro lado, só resta mesmo aparecer como vilão, recortado em silhueta contra esse mesmo Sol.

E, por falar nas tais planícies… no trabalho ao lado do diretor de fotografia J. Michael Muro (Crash: No Limite), Costner claramente quer nos impressionar com a majestade dos descampados e montanhas do interior dos EUA, e até tem algumas ideias interessantes sobre como filmar o Sol batendo no rosto de seus atores, sempre meio a esgueio, criando uma silhueta severa para cada um deles. Na maioria do tempo, no entanto, Horizon é só um faroeste de cores dessaturadas e tomadas óbvias, que carece de vitalidade para brincar com o léxico de um John Ford ou um Sergio Leone, cujas obras Costner parece admirar. De fato, ele se sairia melhor caso aceitasse sua vocação para ser mais um Howard Hawks, cineasta competente que entrava em ebulição mesmo quando as coisas aceleravam no campo da ação.

Há um trecho de Horizon, no primeiro ato, que até ensaia algo assim - mas Costner logo pisa no freio para servir às suas tendências mais melodramáticas e megalómanas, ainda sem entender que o operático não é muito sua praia. Exatamente por ser tão produto do seu autor, o filme se arrasta pelas três horas de duração (e esse é só o capítulo um de quatro, como as últimas cenas no pior estilo “no próximo episódio, em Horizon” deixam claro) confiando que a sua narrativa de destino americano, brutalidade americana, decepção americana e persistência americana vai impressionar simplesmente pela enormidade da tarefa que abraça, pelos milhões de personagens que introduz. Não funciona, porque nenhuma história realmente registra como importante - algumas até registram como incoerentes, e o filme não tem imagens fortes o bastante para fazer dessa incoerência um charme kitsch.

O que Costner não entende é que, como quase todo gênero, no fundo o faroeste é só uma novela. E a natureza da novela é olhar adiante, para o próximo envelope que pode puxar, a próxima atualidade sobre a qual pode falar. Para isso, Horizon não tem talento nenhum.

Nota do Crítico
Ruim