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Pode ser só um momento de transição, de aperfeiçoamento, mas os efeitos digitais estão matando o cinema de ação. Num gênero que depende muito da identificação do espectador com a penúria do protagonista, transformar filmes em verdadeiros videogames com personagens-bonecos irreais não parece uma boa idéia.
Capitão Sky e o mundo de amanhã (Sky captain and the world of tomorrow, 2004), do estreante Kerry Conran, tem tudo para ser um teste crucial. Afinal, a produção maximiza a tendência do CGI: os atores encenam em estúdio diante do fundo verde e todos os cenários são criados e inseridos por computador. O seu grande trunfo é que tudo isso não se coloca a serviço de uma dita vanguarda, pelo contrário. Capitão Sky está voltado para o passado.
A jornalista Polly Perkins (Gwyneth Paltrow) recebe, como nos melhores suspenses hitchcockianos, um objeto esquisito de um homem misterioso que está sendo perseguido. De repente, naves cruzam o céu da Nova York de 1939, holofotes miram robôs gigantes. Eles aterrissam, como nos melhores filmes japoneses de catástrofe, e tocam o terror com raios disparados dos olhos. Um homem ao comunicador chama, como nas melhores ficções científicas tipo B - e com direito a ondas de rádio em círculo - o bravo Capitão Sky (Jude Law) para combater os monstros com o seu aviãozinho.
Essas primeiras cenas são promissoras de verdade. "Empolgante", um adjetivo castigado, se encaixa aqui com justiça. Capitão Sky não trata a sua trama como paródia. Acredita, sim, nesse tipo de abordagem romanceada, em desuso desde os desiludidos anos 70, como maneira mais do que legítima de narrar uma aventura fantasiosa.
Neste caso, a fotografia expressionista tem duas funções. A primeira, pragmática, maquiar a defasagem entre atores reais e cenários virtuais. A segunda é dar ao filme essa aura iluminada que os heróis um dia tiveram - num tempo em que anti-heróis eram só bandidos mesmo, e que mocinhos perfeitos não eram vistos como chatos "certinhos".
Lógico, não vivemos mais naquelas décadas. À medida que a ação transcorre, que nos percebemos diante de mais um corre-corre com diálogos banais e desfechos bestas, o deslumbramento tende a diminuir. A chatice da repórter e a empáfia do piloto deixam de ser uma coisa curiosa e passam a incomodar mesmo. Ao fim do filme, voltamos às questões do começo: falta identificação com os personagens? Falta roteiro? Kerry Conran ainda precisa aprender a segurar o fôlego até o fim, ou os arquétipos dos nossos dias é que ficaram cínicos demais?
O fato é que Capitão Sky tem tudo para dar certo em 1940.