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Em qualquer briga sempre há os dois lados da história. Quando as partes envolvidas são irredutíveis e não abrem mão de seus ideais, a situação tende a acabar em tragédia. Baseado no best seller de Andre Dubbus III, brilhantemente dirigido por Vadim Perelman, Casa de Areia e Névoa (House of sand and fog) retrata de forma genial a falta de limites do ser humano, quando movido por sua própria razão.
A história gira em torno de dois personagens: Kathy Nicolo e Massoud Amir Behrani.
Kathy é uma alcoólatra abstinente que foi abandonada pelo marido e acabou se desligando do mundo. Sua depressão chegou ao ponto dela não abrir sua correspondência durante meses. Esse erro lhe custou sua casa, pois nessas cartas estavam diversas notificações sobre impostos atrasados. Como ela não os pagou, acaba despejada e, da noite para o dia, ela se vê sem dinheiro e sem moradia.
Em justaposição a essas cenas conhecemos Massoud, um ex-coronel da polícia do Irã no regime do Xá. Quando os aitolás tomaram o poder, ele teve de fugir do país com sua família. Morando nos Estados Unidos, encontra-se em outra posição. Antes um homem com dinheiro e poder, é obrigado a trabalhar em dois (sub)empregos para tentar manter o padrão de sua família. Preocupado em conseguir um ótimo casamento para sua filha, Massoud chegou ao ponto de viver de aparências.
Num anúncio no jornal, Massoud vê uma grande chance de mudança: uma casa perto da praia vai a leilão. É justamente o antigo lar de Kathy. O coronel bate o martelo por um quarto do preço de mercado e logo se muda para lá. Enquanto isso, Kathy, completamente dura, mora em seu carro. Com a ajuda de uma advogada, ela tenta reaver sua casa. Sem familiares ou amigos, ela só conta com a simpatia do policial Lester Burdon.
Quem é herói e quem é vilão?
Desse conflito pela casa nasce um thriller psicológico bem amarrado com toques dramáticos. O diretor Vadim Perelman nunca entrega a história, causando uma nova surpresa a cada cena. Não existe um vilão ou um herói definido. A cada momento torcemos por um personagem, para na seguinte mudarmos de lado.
Ben Kingsley dá uma aula de interpretação na pele de Massoud. Um ator soberbo que imortaliza mais um de seus personagens na sua vasta galeria. Ganhador do Oscar por Gandhi, Kingsley já foi premiado e indicado em vários festivais. Jennifer Connely, ganhadora do Oscar por Uma mente brilhante, compete lado a lado com o veterano ator. Ela constrói uma Kathy emocionalmente destruída e comovente, num personagem complexo. Provando mais uma vez que não é simplesmente um rostinho bonito, mas sim uma das melhores atrizes de sua geração. Ver esses dois em ação é uma experiência memorável, mas todo o elenco está bastante afinado. Ron Eldard no papel do xerife Lester Burdon vai progressivamente se transformando. Shohreh Aghdashloo, que faz a esposa do ex-militar iraniano, também está excelente com suas emoções contidas, mas prestes a explodir.
Como trabalho de estréia, Perelman surpreende em todos os sentidos. Ele foi muito feliz em escolher o diretor de fotografia Roger Deakins (Fargo), pois ele trata a névoa como um personagem, envolvendo a casa e criando um clima de pavor. Casa de Areia e Névoa é um filme que nos faz questionar até que ponto devemos lutar, mesmo quando sabemos que estamos certos.