Poucos filmes americanos de apelo mais popular se aproveitam hoje da classificação etária R (17 anos nos EUA) para abraçar um relato de vigor e violência como Invasão a Londres (London Has Fallen). A continuação de Invasão à Casa Branca (Olympus Has Fallen) é a resposta de Hollywood para os atentados que têm se repetido na Europa, com toda a prepotência que o poder bélico americano permite.
Essa sequência estrelada por Gerard Butler dialoga menos com o filme de 2013 do que com a tradição criada na Hollywood dos anos 70 dos justiceiros violentos como Dirty Harry e Paul Kersey, dedicados a endireitar o mundo sem meias palavras. Na trama, Mike Banning (Butler), chefe de segurança do presidente dos EUA (Aaron Eckhart), está prestes a pedir demissão para se tornar pai, mas a morte do Primeiro Ministro do Reino Unido cria uma situação extrema, em que os principais chefes de Estado do mundo viram alvo de um plano terrorista na capital inglesa, durante o velório.
Butler surge aqui como uma atualização de John McClane para a era de CoD: Modern Warfare: ele continua sendo o exército de um homem só, contra um grupo paramilitar mais numeroso e organizado, mas, ao invés de lidar com situações de improviso e precariedade como o astro de Duro de Matar, o protagonista de Invasão a Londres nunca se preocupa com arsenal ou munição, e seu nível de letalidade é tão alto com uma faca (que Butler parece enfiar nos inimigos em fastforward) quanto com projéteis. É o representante máximo da eficiência e também da inclemência, duas bases desse imaginário de guerra moderna.
Não por acaso, o clímax de Invasão a Londres transcorre numa operação de invasão de base com uma trucagem de plano-sequência que lembra bastante a estética dos games, com a câmera logo atrás de Butler, emulando o ponto de vista dos shooters. Nesses momentos, o filme parece dedicado a falar o idioma dos garotos, mas sua posição política não poderia ser mais velha: a defesa de um maniqueísmo que justifique o uso desmedido da força. Quando o presidente pergunta se seu segurança "tinha a necessidade" de matar um dos terroristas a sangue frio, Butler responde com a maior calma e a maior certeza: "Não tinha". O que importa é a demonstração.
E que demonstração: boa parte dos coadjuvantes mal aproveitados do filme, um elenco de renome que inclui Morgan Freeman, Jackie Earle Haley e Melissa Leo, está presente em cena apenas para dar seu aval embasado à intervenção violenta, justificando que "devemos aos nossos filhos e aos seus filhos" o uso de drones em áreas urbanas, porque "é um mundo perigoso" etc. Deve ser um discurso muito convincente mesmo, porque até a espiã inglesa não pensa duas vezes antes de atirar seguidamente num ex-amigo para ter certeza de que ele morreu mesmo.
É provável que muita gente se sinta incomodada, diante de Invasão a Londres, com uma demonstração tão despudorada e simplista de violência. Ainda assim, não deixa de ser curioso e até envolvente como o velho militarismo daqueles filmes de exército-de-um-homem-só pode se transformar e se reciclar nos dias de hoje para atender as fantasias da molecada que cresceu com Call of Duty.