Não espere entender a crise financeira de 2008 por meio de Margin Call - O Dia Antes do Fim. O drama escrito e dirigido pelo estreante J.C. Chandor trata a rotina do mercado financeiro como se fosse de conhecimento geral, sem explicações demais - e nos EUA, onde o escândalo dos créditos imobiliários ajudou a levar à recessão, talvez já seja de conhecimento geral mesmo.
margin call
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Chandor está mais interessado em conhecer as pessoas, dentro da hierarquia de um banco de investimentos, responsáveis pela crise. Não são citados nomes, mas a trama se passa visivelmente na versão ficcional do Lehman Brothers - um dos bancos que mais faturavam em cima de papéis podres (empréstimos feitos a pessoas que dificilmente poderiam pagá-los) e que, da noite para o dia, decidiu vender todos para impedir um caos de liquidez que arruinaria o banco.
Como se viu na realidade, inundar o mercado com papéis podres pode ter salvo alguns pescoços (que mantiveram seus pescoços e também seus bônus) mas provocou a paralisia de todo o sistema financeiro. Essa discussão ética - cair sozinho ou adiar a queda enquanto os outros caem primeiro - está no centro de Margin Call e afeta desde o mais inexperiente operador de Bolsa (Penn Badgley) até o presidente do banco (Jeremy Irons), nas 12 horas desde o diagnóstico do problema até a decisão de livrar-se dos papéis.
Talvez por transcorrer ao longo de uma madrugada, o que sobressai ao longo do filme é a solidão. Corredores vazios e janelões que dão vista para uma Nova York impassível assistem à passagem de personagens que se encontram diariamente mas mal se comunicam. A conversa padrão é tentar descobrir quanto o outro lucrou nos últimos 12 meses. Para incentivar diálogos improváveis na hierarquia de uma grande corporação (o chefe trocando confidências com o novato), o filme toma até liberdades criativas como sugerir que o diretor usa o banheiro comum da empresa, e não um privativo, para se barbear de manhã.
Esse estudo de personagens é a força e também a fraqueza de Margin Call. Força porque dá espaço para nomes como Paul Bettany, Stanley Tucci, Kevin Spacey e Demi Moore construírem os seus com propriedade (Spacey, que divide certo protagonismo com o operador interpretado por Zachary Quinto, sai da inércia de seus outros papéis recentes e se destaca). Mas é uma fraqueza porque Chandor se força a transformar alguns desses personagens em tipos específicos - cada um deles exemplificando um "mal" que a vida no mercado financeiro pode fazer às pessoas.
E aí a narrativa de Margin Call, que inicialmente parece aberta a entender as motivações dessas pessoas, se confunde com lição de moral. Tem a executiva que abriu mão da maternidade para se dedicar à profissão, tem o sujeito decente que vai terminar se ferrando porque pagou a casa com ações do banco, e tem, finalmente, o funcionário com décadas de serviço prestado que não subiu na hierarquia por ser ético e que viu, nesse tempo, seu casamento desmoronar.
Chandor se concentra, ao final do filme, nesses funcionários mais antigos (Demi, Spacey, Tucci) e larga Quinto e Badgley meio que pelo caminho porque o primeiro grupo serve melhor ao seu propósito de mostrar o lado desalmado do mercado, aquele que leva anos mas consome o indivíduo por completo. Margin Call parece ignorar toda uma parcela cinza entre esses opostos: aqueles que souberam entrar no jogo, enriquecer rápido e sair - que afinal é o propósito de quase todo estagiário que se aventura em um banco de investimento, com ou sem crise. Aliás, foi esse tipo de ganância de curto prazo que a provocou.
Margin Call - O Dia Antes do Fim | Trailer
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