Ex-baixista do The Frames, influente grupo da cena irlandesa, John Carney deixou a música pelo cinema, mas a música nunca o deixou. Em 2006, se juntou ao antigo colega de banda Glen Hansard para criar Apenas Uma Vez e deixou a sua marca entre os musicais modernos.
Mesmo Se Nada Der Certo (Begin Again) segue a mesma lógica do filme premiado com o Oscar de Melhor Canção em 2008 - duas pessoas perdidas que se encontram pela música -, mas o faz de forma diluída, trocando a austeridade europeia pela maleabilidade americana. Keira Knightley vive Gretta, uma jovem compositora sem confiança no próprio talento que se vê sozinha em Nova York depois de perder o namorado (Adam Levine) para a fama. Mark Ruffalo é um produtor musical desprestigiado por suas escolhas profissionais e pessoais. Ele a vê tocando sozinha e visualiza o que ela poderia se tornar. Uma epifania ébria que pode salvar os dois.
A cena em que a personagem de Knightley assume o palco e vira objeto de atenção para o produtor toma o primeiro ato do filme. Começa com o ponto de vista dela, insegura, cantando suas desilusões para uma plateia desinteressada. Depois segue a trajetória de Ruffalo até o encontro, em um dia de fracassos sequenciais que culmina em uma resposta do destino. Uma banda invisível acompanha a cantora aos olhos e ouvidos do produtor, em uma das cenas que mostram a música como um personagem, não apenas como condutor narrativo. O mesmo vale para a ideia de gravar na rua o álbum de Gretta, misturando sua voz e os instrumentos aos sons da cidade que a encantara e maltratara.
Essa ligação sincera é o que torna Mesmo Se Nada Der Certo possível: as canções do longa convencem por sua qualidade e seus atores convencem como músicos. As composições de Carney, Hansard e Gregg Alexander (com a colaboração de outros produtores musicais) são definitivas para que a história se conecte ao público. Já Knightley sabe cantar e convence na sua postura de indie pé no chão. Levine, por outro lado, consagrado como músico, não atrapalha com o seu lado ator.
Ainda que leve a momentos catárticos pela música, Mesmo Se Nada Der Certo, assim como Apenas Uma Vez, não é o filme sobre metamorfoses que aparenta ser. O encontro entre seus personagens não transforma, leva à aceitação - eles apenas passam a compreender a própria história. Para Carney, a música leva ao autoconhecimento e esse é o caminho para a evolução.