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Nerve - Um Jogo Sem Regras | Crítica

Os amores teen chegam ao gênero cyberpunk em filme bem resolvido no que propõe

25.08.2016, às 16H46.

De todos os filmes de gênero feitos hoje em Hollywood para engajar um público infantojuvenil com histórias de perigo e morte sem de fato colocar em risco a conformidade de uma narrativa sem agressões,Nerve - Um Jogo Sem Regras está entre os mais interessantes. Porque o longa baseado no romance homônimo de Jeanne Ryan poderia, em teoria, patinar na sua premissa aparentemente inconciliável.

Essa premissa: contar uma história cyberpunk, o gênero por excelência da anulação do indivíduo, com personagens que representam a segurança econômica e os interesses de ego da era dos millennials. É como uma grande brincadeira de aproximação entre esses dois extremos que Emma Roberts e Dave Franco vivem em Nerve sua história de amor por uma noite em Manhattan, dentro de uma distopia que já tratamos hoje como natural: viver em função dos jogos de popularidade que as redes sociais trouxeram do colegial para nossa vida adulta.

Vee (Roberts) quer se provar para a "sociedade" (seus amigos) e aceita participar do jogo de voyeurismo do título, em que observadores propõem desafios para aqueles que topam ser jogadores. É como se Chuck Palahniuk tivesse decidido escrever Clube da Luta não como uma releitura indie do cyberpunk mas como uma versão de Cinderela. Vee aceita desafio atrás de desafio como a gata borralheira que só tem até a meia-noite para aproveitar seu príncipe - cujo cavalo branco é substituído pela moto, assim como o guerreiro medieval que se põe no seu caminho é substituído por um cosplayer de Mad Max. Nerve lida de um jeito bastante consciente com a iconografia dos contos de fada - a protagonista não usaria um capaz vermelho de outra forma - para reafirmar o faz-de-conta, para proteger o espectador dos perigos reais que a trama cita (a realidade de Staten Island e do gangsta rap, a violência do fim da privacidade) enquanto glamouriza a rebeldia do hacktivismo.

Mas não há anarquia de fato em Nerve, apenas a adrenalina, do medo de altura ou de velocidade. De novo, o que dá o tom é a brincadeira: tudo aquilo que o cinema americano ensinou a associar com morte de fato, como o abuso de drogas ou o sexo inconsequente, é vilanizado ou simplesmente ignorado em Nerve em nome da inofensividade.

Se Nerve funciona dentro dessa proposta é porque os diretores Henry Joost e Ariel Schulman, de Atividade Paranormal 3 e 4, executam com competência esse simulacro, a experiência controlada. Particularmente um filme anterior da dupla, Catfish, já partia dessa crença na redoma não como um espaço de alienação mas de afirmação de individualidade. Então, a partir de um rigor no enquadramento, Joost e Schulman usam close-ups sistematicamente em Nerve para contar sua história, e nesses close-ups Emma Roberts e Dave Franco estarão para sempre protegidos do mal.

É como se os diretores elevassem a gramática das webcams a linguagem básica de diálogo com o mundo, transcendendo o virtual para o real (os HUDs e as plaquinhas de identificação de pessoas no skyline de Nova York são uma coisa verdadeiramente cyberpunk). Todos em Nerve olham para telas - e não necessariamente são tragados por elas - e pelas câmeras dos smartphones tudo se vê. Nesse sentido, temos aqui um filme muito imediato de estabelecimento de situacões, de personagens e arcos, descomplicado nas suas escolhas de arquétipos e premissas. Poucos filmes hoje fazem, como Nerve, uma opção tão clara e bem resolvida pelo lúdico.

E no fim só resta ao enamorado casal protagonista aproveitar o passeio, em primeira-pessoa. Dentro de cada close-up do casal cabem todas as experiências do mundo - é o que parece dizer a fotografia de Nerve, que transforma tudo em neon e mantém sempre as luzes da cidade ao fundo, desfocadas, respondendo pelo resto da composição do quadro enquanto Vee e seu príncipe trocam beijos e promessas. Embora pareça complexo, o futurismo de Nerve se consuma como um sonho simples de adolescente, e o único perigo real é que vire a meia-noite e o caleidoscópio chegue ao fim.

Nota do Crítico
Ótimo