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Crítica

Nyad é história de triunfo esportivo carregado por suas performances

Sem forçação de barra, filme da Netflix é inspirador na medida certa

05.03.2024, às 16H54.
Atualizada em 05.03.2024, ÀS 18H08

Que ano difícil para a categoria de melhores atrizes no Oscar de 2024. Por mais que Emma Stone e Lily Gladstone estejam à frente da disputa, é difícil tirar os olhos do que Annette Benning demonstra em Nyad. Neste singelo filme sobre a nadadora que atravessou o mar que separa Cuba da Flórida, Benning é uma força da natureza que incorpora, em seu olhar, postura, e cada um de seus mínimos movimentos, a potência imparável de uma esportista. Seu desafio de interpretação é ainda maior porque a atriz “divide” a tela com a Nyad real. 

Nyad faz a escolha peculiar – principalmente para filmes inspiracionais de esporte – de intercalar, sem embaraço, as imagens de Benning com a própria Diana Nyad, um movimento que nunca soa estranho e, para além, evoca a lembrança de que esta foi uma mulher que conseguiu o que era considerado impossível. E tudo na performance da atriz evoca precisamente isso; o desejo quase cruel pela conquista, a persistente desconsideração do perigo, a falta de traquejo social – que quase sempre pende ao egocentrismo –, tudo isso espuma como uma arrebentação dentro da atriz, e transborda em um olhar feroz e inquieto que nunca deixa a tela.

Mas existem, também, duas coisas que auxiliam Benning no percurso, sem as quais Nyad não seria o triunfo que é: o trabalho de maquiagem e Jodie Foster. A química entre as duas atrizes é perceptível desde o primeiro minuto da dupla em tela, e Nyad faz questão de nunca desperdiçá-la, entrelaçando a jornada da nadadora com um conto de amizade feminina raro de encontrar. A oportunidade de indicar ambas ao Oscar - únicas categorias em que o longa concorre à estatueta - faz justiça a esse esforço.

E se no mundo real a história de Nyad foi colocada em dúvida (basta uma simples pesquisa para sair falando “ah, mas não foi bem assim”), os diretores Elizabeth Chai Vasarhelyi e Jimmy Chin (a dupla por trás do documentário Free Solo) nem acenam em direção à dúvida. A escolha, que pode parecer estranha para os conhecedores da trajetória de Nyad, é muito bem fundamentada na narrativa da roteirista Julia Cox: este não é um filme sobre treino, persistência ou luta contra os estereótipos da sociedade. Ela passa por cada um destes quesitos, claro, mas Nyad é muito mais sobre a refuta à espera da morte e a valorização do envelhecimento. 

O filme da Netflix, muito espertamente, não faz com que o tema soe forçado ou panfletário, passando longe de uma declaração estranha e anti-etarista. Ao retratar a travessia de Diana, Nyad transmite quão importante sua idade foi para sua conquista – ele estabelece, insistentemente, que tal feito, ao contrário das expectativas, só seria possível naquele momento da vida de Diana, aos 60 anos.

É curioso que isso seja feito, também, em uma cinebiografia que se afasta da estrutura óbvia da passagem dos anos para focar única e absolutamente nas tentativas de travessia de Diana, posicionando cada um de seus aprendizados e traumas nas meditações que ela exercita durante o nado. É perfeitamente apropriado que a mente de Nyad voe por sua infância e seus momentos felizes no começo de cada travessia – e simbólico que sua mente recaia para o abuso que sofreu enquanto atravessa seus momentos mais desafiadores. A escolha não somente faz de Nyad uma cinebiografia esportiva com cara de novidade, como diferente em um dos quesitos mais tradicionais do gênero: aqui, não há forçação de barra, embora a narrativa passe obrigatoriamente pelo louvor da superação. O trauma da pequena Nyad é retomado não pelo simples fator de tragédia, mas pela necessidade de enfrentá-lo para chegar ao fim. 

Por todos os clichês do gênero, Nyad se desenrola com facilidade atiçando emoções sem precisar de muito sentimentalismo, em uma viagem muito bem representada pelas escolhas musicais da (sempre ótima) supervisora musical Susan Jacobs. Nyad é um filme feito de hits fáceis, mas não por isso menos cativantes, que flutuam entre “The Sound of Silence” e “Piece of My Heart” com confiança. São faixas certeiras, que nunca correm o risco de tropeçar no brega por estarem sustentadas em performances gigantes. 

Nota do Crítico
Excelente!