Talvez seja incentivado pelo sucesso da nova onda de contos de fadas animados da Disney, como Frozen, ou de séries de TV desse gênero, como Once Upon a Time, mas o fato é que a Universal não tem vergonha de assumir as facetas mais cafonas, fantasiosas e novelescas das histórias de cavalaria em O Caçador e a Rainha do Gelo (The Huntsman: Winter's War, 2016), misto de prelúdio e continuação de Branca de Neve e o Caçador,
Cedric Nicolas-Troyan, especialista em efeitos do filme de 2012 estrelado por Kristen Stewart, faz aqui a sua estreia como diretor de longas-metragens. A atriz não reaparece, e seu lugar feminino de destaque é substituído não apenas por uma nova heroína (Jessica Chastain, flertando meio timidamente com os blockbusters) mas também por uma vilã para fazer par à bruxa má Ravenna (Charlize Theron), a tal Rainha do Gelo, vivida por uma Emily Blunt à vontade nos trejeitos de largo alcance que esse gênero mais teatral permite.
Na trama, o caçador Eric (Chris Hemsworth) tem sua origem contada, e ao mesmo tempo precisa impedir, anos depois da derrota de Ravenna, que o espelho mágico caia em mãos erradas. Hemsworth parece atuar como um Errol Flynn moderno, à base do seu sorriso, e visivelmente é a peça estranha nesse arranjo de O Caçador e a Rainha do Gelo, que trata não apenas de temas femininos fortes (maternidade, a obsessão da juventude), com um elenco principal de mulheres (até as anãs dominam a cena entre os alívios cômicos), como também tem um olhar mais aguçado para elementos normalmente associados com a sensibilidade das mulheres, da cenografia e os figurinos à direção de arte.
É uma pena que O Caçador e a Rainha do Gelo não consiga canalizar essas questões numa unidade capaz de dar ao filme uma consistência maior. Elementos parecem dispostos em cena com liberdade mas sem propósito, e com frequência fica a impressão de que assistimos a um filme de fantasia de matinê dos anos 1980 (época em que o gênero passou por um dos seus auges em termos quantitativos em Hollywood), cheios de ideias e que dominam a arte de criar maquiagens e figurinos e paisagens atordoantes, sem que isso necessariamente transmita uma visão de mundo, de autor. O resultado beira o guilty pleasure, mas não por isso deixa de ter seus momentos prazerosos.