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O Destino de Júpiter | Crítica

Irmãos Wachowski continuam resistindo ao sistema, em uma ópera espacial sem ironias

05.02.2015, às 12H00.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H40

Enquanto os blockbusters se ajustam há anos à sobriedade de um suposto realismo - do uniforme de couro dos X-Men às justificativas científicas de O Homem de Aço - os irmãos Wachowski escolheram seguir na contra-mão a partir de Speed Racer (2008). O Destino de Júpiter (Jupiter Ascending) é mais um passo nessa direção.

Isso fica claro, a princípio, pela forma como os irmãos diretores trabalham o imaginário da ufologia no filme. Os greys existem, mas não são meros alienígenas em visita à Terra e sim uma mistura de espiões com matadores de aluguel. Os círculos nos campos de trigo e milho também estão presentes, mas não são simples rastros de OVNIs e sim registros de perseguições de espaçonaves. Por fim, o feixe azul que vem do céu, associado à abdução nos filmes de invasão, são aqui como elevadores que conduzem a aventuras no espaço.

Esses exemplos deixam claro que, de fato, os Wachowski não estão interessados em desmistificar o que o cinema de gênero tem de misterioso - O Destino de Júpiter é o oposto de Interestelar nesse sentido - mas sim em amplificar o mistério, a fantasia. A imagem do feixe de luz se presta a síntese do filme: Lana e Andy Wachowski buscam elevar o cinema de gênero, neste caso o subgênero conhecido como ópera espacial, que há décadas alimenta a ficção científica com aventuras, romances e melodramas, de Flash Gordon a Guardiões da Galáxia.

A trama combina Cinderela com Final Fantasy para contar a história de Jupiter (Mila Kunis), filha de imigrantes que trabalha de faxineira em Chicago e nem suspeita ser a reencarnação da rainha de uma das dinastias mais poderosas do universo. Na sua disputa por poder, os três herdeiros dessa rainha descobrem Jupiter na Terra, e começa a caçada pela donzela. Cabe a Channing Tatum fazer uma versão X-Games do tradicional príncipe-no-cavalo-branco: um mestiço albino de terráqueo com lobo que anda sobre patins invisíveis.

"Deixe-me mostrar as possibilidades do seu futuro", escuta Jupiter de sua "filha" ao ser apresentada às estrelas. Se o cinema de ação dos irmãos Wachowski sempre tratou de tirar o homem comum do jugo do sistema (corporações, máquinas, dinastias) e mostrar-lhe um mundo condicionado apenas ao poder da imaginação (até mesmo a ideia de colheita humana é igual à de Matrix), então O Destino de Júpiter está fadado ao experimentalismo. Testar os limites da fantasia, por mais que seja absolutamente cafona a ideia de um cavaleiro albino sobre patins, é a vocação e o propósito desta space opera.

O fato de Chicago se refazer magicamente após uma devastação - seria uma cutucada em Michael Bay e Zack Snyder? - é a senha dessa liberdade criativa. Se O Destino de Júpiter se estabelece todo em cima dessa premissa, então, por que o filme, nos seus momentos mais frágeis, parece fracassar por insuficiência? A montagem de Alexander Berner, vacilante, corta planos em pleno crescente dramático, como se o filme temesse abraçar o operístico de vez.

Talvez a comparação com Guardiões da Galáxia ajude a entender o que dá "errado" com O Destino de Júpiter. Enquanto o filme de James Gunn usa a música pop e diálogos cheios de punchlines para desarmar a gravidade da ópera espacial e torná-la familiar ao público de hoje, Mila Kunis e Channing Tatum - atores representativos de uma geração criada à base de consumo irônico - se desesperam em cena por um alívio cômico. Os dois ameaçam olhar para a câmera o tempo inteiro, esboçando aquela piscadela do tipo "sei que estou ridículo", mas os Wachowski simplesmente não correspondem. Quando há humor de autorreferência em O Destino de Júpiter, o filme o faz constrangido ("meu intestino é nobre").

Não por acaso, o ator que melhor parece entender o espírito da coisa é Eddie Redmayne, cuja formação no teatro em tese o torna mais aberto à grandiloquência. Na medida do possível, o vilão interpretado pelo ator compensa a apatia do casal protagonista e carrega O Destino de Júpiter, um filme cheio de sonhos que acabam antes da hora de acordar, e que acima de tudo comprova como os irmãos Wachowski se descolaram do seu tempo.

O Destino de Júpiter | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Bom