O Escaravelho do Diabo, a adaptação ao cinema do livro infanto-juvenil de Lucia Machado de Almeida (1910-2005), tem a velocidade da vida no interior. O longa do diretor Carlo Milani conserva a ambientação e resiste à tentação de atualizar demais o contexto e as situações do conhecido livro da Série Vaga-Lume.
O fato de o jovem Alberto Maltese (Thiago Rosseti) viver com seu iPad a tiracolo, para demarcar a hiperatividade do protagonista, que leva bronca da mãe por fazer várias coisas ao mesmo tempo, é uma das poucas concessões tomadas por Milani num filme que parece congelado no passado. É como se chegássemos a Vale das Flores por um portal; da Mercedes-Benz do delegado Pimentel (Marcos Caruso) à população de ruivos da cidade, tudo no filme nos soa estranho ou ultrapassado.
No papel, esse parece um bom ponto de partida: na trama de mistério, sobre um assassino em série que está matando ruivos em Vale das Flores, Milani rejuvenesce Alberto (no livro ele é estudante de Medicina) para transformar o protagonista no nosso representante dentro do filme, e evocar o espírito infantil dos livros - em outras palavras, é como se Milani personificasse a nossa nostalgia pela Série Vaga-Lume em Alberto, apostando que os adultos que cresceram com ela nos anos 70 e 80 pudessem, diante do filme, voltar a ser crianças.
Ao mesmo tempo, rejuvenescer Alberto é uma necessidade evidente, se o filme pretende atrair o público infantil de hoje. Apelos de nostalgia à parte, na hora de atrair esses espectadores mais jovens O Escaravelho do Diabo talvez encontre mais dificuldade. Porque, na comparação com sucessos de hiperatividade do cinema, como os filmes de Madagascar, o longa de Milani é praticamente cinema iraniano, com seu passo moroso e seus planos longos demais.
Ainda que esse transporte a outro tempo e outro lugar - a vida no antiquário, a fazenda, a igrejinha, a escola - esteja no cerne do projeto "regressivo" do filme, O Escaravelho do Diabo parece lutar o tempo todo consigo mesmo: lida com um gênero como o suspense, que exige dinamismo, e flerta com elementos mais atuais, como o rap e o rock, mas em nenhum momento consegue deixar a morosidade ou realmente trazer o livro à vida de uma forma mais contemporânea.
O resultado traduz essa indecisão, e no fim talvez O Escaravelho do Diabo não consiga falar a língua dos adultos nem a dos mais novos.