O primeiro minuto de O Guarda (The Guard, 2011) me desarmou de tal forma que, viesse o que fosse a seguir, eu já teria gostado do filme. Esses 60 segundos sintetizam a imprevisibilidade, a estranheza e o carisma do personagem central do filme de John Michael McDonagh.
O Guarda
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O diretor estreante é irmão de Martin McDonagh, do igualmente memorável Na Mira do Chefe. Bons genes para o humor negro ou será que todos os irlandeses são assim? Não importa, contanto que continuem aproveitando Brendan Gleeson (o Olho-Tonto de Harry Potter e também coprotagonista de Na Mira do Chefe) dessa forma.
O ator está inspiradíssimo no papel do Sargento Gerry Boyle, um policial rabugento, corrupto (só quando acha que vale a pena) e chegado em uma prostituta dublinense. Sua pacata existência, dividida entre o pub, sua casa e a delegacia, é ameaçada com a chegada de um agente do FBI (Don Cheadle), enviado à Galway, na costa da Irlanda, para desbaratar uma operação de drogas de 500 milhões de dólares.
A improvável colaboração entre o dedicado oficial dos EUA e o desinteressado policial irlandês é o ponto alto da produção, que explora, sem receios, a chatice dos tempos politicamente corretos (ninguém é poupado no filme), com diálogos de uma acidez digna das entranhas de um Alien. Mas Gleeson e Cheadle estão em excepcional companhia. O trio de barões das drogas, formado por Mark Strong, Liam Cunningham e David Wilmot, merecia um filme à parte. Suas discussões filosóficas sobre Schopenhauer, Nietzsche e Russell, parecem saídas de um filme de Tarantino, se Tarantino se interessasse mais por tais assuntos e menos por Surfista Prateado e Madonna.
Visualmente, O Guarda é uma versão "séria" dos filmes de Wes Anderson. Estão lá os mesmos planos simétricos e estranhos e os sets cafonas, mas tudo registrado com uma qualidade realista, meio lúgubre, que torna esse universo ainda mais esquisito e interessante. Olhando as fotos é até difícil perceber que se trata de uma comédia, o que só valoriza o trabalho de câmera de Larry Smith (Bronson) e a qualidade do texto de McDonagh.
E se o primeiro minuto já fez valer o filme, o que dizer dos últimos, que trazem um clímax que bate no liquidificador Sergio Leone, a bravata de ação hollywoodiana e caçoa de tudo isso, ao som de um Morricone propositadamente genérico. Ao final, Brendan Gleeson prova que a alma de um herói de ação...
Pena (ou não) que tenha trocado os suplementos e a academia pelos pints de Guinness.
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