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O Invasor | Crítica

Apesar do apelo de atores globais o resultado não soa superficial ou forçado.

05.04.2002, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H12

Chamar de promissora a carreira cinematográfica do paulistano Beto Brant, três longas em cinco anos, é chover no molhado. Formado em 1987 no curso de Cinema pela FAAP, ex-aluno de teatro da escola Proscênio, no Bexiga, Brant acumula, com a sua experiência cinematográfica, prêmios nacionais e internacionais, além de aspectos visuais e narrativos que se tornaram suas marcas registradas. Em apenas três películas, Os matadores (1997), Ação entre amigos (1998) e no novíssimo O Invasor (2001), o diretor, também roteirista, se faz conhecer e respeitar.

Sua justificativa para ter abandonado o palco (aliás, Brant se considerava um ator de qualidade) não poderia ser mais pragmática: tinha pressa, e o caos dos grupos teatrais limitava essa urgência. A saída encontrada foi a linguagem do vídeo. Tal qual muitos dos jovens autores de sua geração, como Patricia Melo, Fernando Bonassi e Marçal Aquino, inspirados por Rubem Fonseca, o diretor busca nas tramas policialescas e no submundo criminoso uma explicação para problemas sociais. Aquino, aliás, co-assina os roteiros das produções de Brant.

A temática das suas tramas coincide. O mais bem realizado, sua estréia, um retrato da realidade na fronteira Brasil-Paraguai e as suas mortes por encomenda, ganhou vários Kikitos no Festival de Gramado. O segundo repete o mote dos assassinatos, quatro amigos, torturados durante a Ditadura, buscam vingança contra o seu carrasco. Agora, chega O invasor, com cenas cheias de movimento e ação; dentre as três idéias a mais crua, a mais provocativa e a mais premiada.

Grande fliperama

Como cenário, a Paulicéia e a sua divisão desleal entre a insanidade suburbana e as negociatas da elite. Parceiros numa construtora, Ivan (Marco Ricca) e Gilberto (Alexandre Borges) brigam com o sócio majoritário, Estevão (George Freire), quando este se nega a participar de uma associação fraudulenta. Ambiciosos, Gilberto e Ivan decidem contratar um matador, simular um seqüestro, eliminar Estevão e assumir a empresa. Assim, rumam à periferia atrás de Anísio (o titã Paulo Miklos), um mercenário de aluguel. Dias depois, serviço completo.

No entanto, a reação seguinte de Anísio, o invasor do título, surpreende a dupla. Com desenvoltura, ele chantageia os mandantes, emprega seus "manos" na construtora, e ainda cria amizade com Marina (Mariana Ximenez), exatamente a órfã de Estevão. Daí, sufocados, Ivan e Gilberto desesperam-se. Apesar do apelo de atores globais e da inusitada participação do músico Miklos, o resultado não soa superficial ou forçado. O titã surpreende, um desempenho digno do troféu especial do júri como ator-revelação, entre outros cinco prêmios, no Festival de Brasília, em 2001. Cabe a Ricca, no entanto, sustentar o roteiro naquilo que há de mais importante: suas expressões exibem bem o conflito psicológico e moral que surge dos desdobramentos do crime.

Os méritos da fita enumeram-se além das já citadas. Merecidamente, O Invasor recebeu, em janeiro de 2002, o prêmio de melhor filme latino-americano em Sundance. O tratamento dado à cidade também se destaca. Filmada numa película de 16mm, depois trabalhada e adaptada para a tradicional 35mm, a bela fotografia exibe a metrópole como um grande fliperama, seja no grafite da periferia, na velocidade das grandes avenidas ou nas cores psicodélicas das casas noturnas. Também a trama mostra-se fiel: todas as falas de Anísio foram escritas pelo rapper Sabotage, um dos responsáveis pela trilha sonora barulhenta, que inclui, claro, Paulo Miklos.

Enfim, há muito o que comentar. Aos paulistanos, o programa é obrigatório. O Invasor possui as qualidades daqueles filmes que não esgotam análises e discussões.

Nota do Crítico
Excelente!