A explosão de cores que abre Perlimps parece não deixar dúvidas de que o mundo no qual o espectador está prestes a entrar é bem diferente do que o que de fato o cerca. O Bosque Encantado que os protagonistas Claé (Lorenzo Tarantelli) e Bruô (Giulia Benite) querem salvar das garras dos temidos Gigantes é lúdico, rítmico e tomado por uma natureza exuberante. Ali, o tempo até parece operar de uma forma particular — calma, apesar da urgência da missão da dupla. No entanto, mais discrepante ainda é o fato de que este cenário é inegavelmente receptivo aos contrastes: na mesma medida que tons opostos tomam conta da telona em completa harmonia, os dois pequenos heróis, ainda que fiéis à rivalidade dos seus povos, dão uma chance para a reconciliação.
É através desse visual e dessa dinâmica infantis que o brasileiro Alê Abreu (O Menino e o Mundo) pega o público desprevenido. Lançando mão de elementos clássicos das fábulas, o diretor esconde à vista justamente as semelhanças com a vida como ela é e traduz, de modo simples e direto, a cacofonia dos adultos.
E não há mesmo nada de mirabolante nesse movimento. Na realidade, Perlimps é, por essência, uma história em alguma medida familiar e desenvolvida de modo até bastante imediato. Há a desconfiança inicial e a resistência de se abrir, seguida pelo aprendizado que suas habilidades se complementam, o encontro com uma figura sábia, um desentendimento tenso e a compreensão de que, apesar de origens diferentes, no fundo têm os mesmos valores. Quer dizer, não tem nada de muito inovador. É, na verdade, um encaminhamento clássico, até porque Perlimps, embora complexo temática e estéticamente, não quer inventar a roda. É, com orgulho, um filme voltado especialmente para crianças — intenção palpável, inclusive, nas performances adoráveis de Benite e Tarantelli —, e por isso sustenta sua experiência cinematográfica mais na imersão que na surpresa.
Porém, como uma boa fábula, a âncora emocional de toda essa jornada está na sua conclusão e na moral da história, estas, sim, um tanto inesperadas. Não se pode dizer que os ecos com o mundo real não estavam lá antes — as temidas águias são obviamente versões reimaginadas de aviões, por exemplo —, mas a seriedade do que estava por trás de todas as provocações inocentes entre Claé e Bruô é impactante. É quase como um tapa na cara de tão realista e atual, algo que a alegoria ambiental da preservação do Bosque Encantado apenas pincela e seu colorido, símbolo da efervescência da imaginação infantil, esconde. Por isso, talvez a maturidade da “mensagem” os pequenos espectadores só vão compreender por completo daqui alguns anos, mas seus pais não poderão fugir.
A simplicidade de Perlimps, nesse sentido, é seu grande trunfo. Ao colocar em termos acessíveis conflitos políticos que se repetem ao redor do mundo, sem especificar territórios ou personagens, a animação de Alê Abreu põe às claras o que adultos tendem a complicar muitas vezes por orgulho e teimosia. Ao final, a conciliação dos jovens Claé e Bruô é um incentivo senão para o convívio entre os diferentes, para a proteção da sua criança interior.