Cena de RM: Right People, Wrong Place (Reprodução)

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Crítica

Right People, Wrong Place é retrato hesitante de artista tentando se encontrar

RM, líder do BTS, busca sua própria identidade em documentário um tanto difuso

23.12.2024, às 14H26.
Atualizada em 23.12.2024, ÀS 16H36

Em meados do ano passado, falei do documentário J-Hope in the Box aqui no Omelete, saudando o registro dos bastidores da empreitada solo de J-Hope, integrante do BTS, como “um ótimo estudo de alienação na arte. Interessante resgatar isso agora, porque seria fácil dizer que RM: Right People, Wrong Place fala da mesma coisa - afinal, é outro documentário de menos de 1h30 de duração que serve como making of de um disco solo de um integrante do fenômeno do k-pop, e que portanto lida com alguns chavões em comum: a internacionalização do grupo de colaboradores do artista, por exemplo, traz obstáculos de comunicação e linguagem; a vontade de declarar uma identidade solo após anos de BTS, enquanto isso, representa seus próprios desafios e dobra o peso das escolhas artísticas colocadas sobre o solista.

Ora, o filme até se chama Right People, Wrong Place (em tradução literal: Pessoas Certas, Lugar Errado), frase que evoca um desajuste e um desconforto que só pode ser superado a partir da colaboração, da conexão humana. O esqueleto de uma exploração do que eu chamei de “alienação na arte”, da solidão essencial do artista como ser expressivo, mesmo diante de um time cuja razão de ser é lhe ajudar a se expressar, está todo aqui. Acontece que, muito até para legitimar a realização desses documentários solo dos membros do BTS para além do retorno financeiro, RM é uma pessoa muito diferente de J-Hope, tanto como artista quanto como jovem adulto em busca de validação emocional.

O que emerge do documentário assinado por Lee Seok-jun (parceiro constante de vários integrantes do BTS), portanto, é um rapaz muito mais preocupado em procurar sua identidade do que preparado para colocá-la à vista, seja no palco ou no encarte de um álbum. A música de RM também reflete isso, é claro - o disco do qual este filme faz crônica, intitulado Right Place, Wrong Person, é todo busca: do jazz ao R&B, do baixo acústico à guitarra elétrica, da parceria com Little Simz ao gancho melódico assobiado da canção de encerramento, “Come Back to Me”, ele é uma obra de exploração, de teste dos limites formais para os quais RM é capaz de se esticar, de pesquisa e ajuste. É um artista buscando uma posição onde possa se sentir confortável sozinho.

Esta é a mesmíssima sensação que o filme evoca, no fim das contas. Em seu melhor, RM: Right People, Wrong Place é uma mistura de texturas e formatos cinematográficos que servem para nos transportar para essa jornada de RM, na intenção de caminhar com ele na direção dessa descoberta - embora ele nunca de fato chegue lá, seja pelo prazo apertado para finalizar o álbum antes de seu alistamento militar, pela pressa para fechar o documentário em uma duração palatável para os cinemas comerciais, ou pela própria natureza irrespondível das questões que ele posiciona para si mesmo. Quem é RM, afinal? Quão de si mesmo ele pode ser, agora que não é “só” o líder de um grupo? Nem ele sabe a resposta, mas o seu filme tem alguma potência quando interroga e quando retrata a angústia de não saber.

É verdade que Right People, Wrong Place é, também - por sua própria natureza -, um filme incompleto. RM, diretor e colaboradores musicais oferecem no máximo uma peça do quebra-cabeças, uma ideia que flutua no ar de maneira frustrantemente enigmática. A busca pela identidade não começa e nem termina aqui, e o filme mesmo parece não estar tão interessado em segui-la adiante, ver para onde esse caminho leva. Entre sessões de estúdio e photoshoots, desabafos no estacionamento de uma cabana afastada e pequenas férias no campo, aparece aqui também uma insistência (de câmera e de montagem, na seleção de falas usadas no filme) em divagar por tangentes que não levam a lugar nenhum, que não nos ajudam a entender ou vislumbrar nada.

Talvez a falta de foco seja todo o ponto, é claro, mas ela não deixa de resultar em um documentário muito menos penetrante do que poderia ser.

Nota do Crítico
Bom