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Sete Psicopatas e um Shih Tzu | Crítica

Depois de Na Mira do Chefe, Martin McDonagh vai a Los Angeles estender seus comentários sobre matadores no cinema

03.01.2013, às 22H00.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H45

Em seu ótimo filme de estreia, Na Mira do Chefe, o diretor londrino Martin McDonagh fez uma inteligente sátira à violência automatizada dos assassinos sem culpa do cinema. Em Sete Psicopatas e um Shih Tzu (Seven Psychopaths), McDonaugh deixa a Bélgica e vai a Los Angeles, epicentro do faz-de-conta, e tenta aumentar o escopo dessa sátira, mas cai em armadilhas da metalinguagem.

sete psicopatas

sete psicopatas

sete psicopatas

De John Dillinger a Takeshi Kitano, a trama já começa cheia de citações para contrapor a violência de Hollywood e da "vida real". Colin Farrell interpreta Marty, um roteirista alcoólatra que está tentando fazer um típico "filme de caras com armas nas mãos". Com a ajuda do alucinado Billy (Sam Rockwell) - que ganha a vida furtando cães e depois devolvendo-os para ganhar o dinheiro do resgate - Marty junta pedaços de histórias para criar sete tipos psicóticos para seu filme, que ele pretende chamar, claro, de Seven Psychopaths.

A ação começa a se mover quando, como o espectador já espera, os tais psicopatas cruzam de verdade o caminho de Marty e Billy. O principal deles é Charlie (Woody Harrelson), mafioso sem escrúpulos cujo único amor - seu cão shih tzu - é roubado por Billy. McDonagh faz uma escolha interessante para esse papel de Harrelson: Charlie não é um gângster fácil de enquadrar em estereótipos étnicos (carcamano italiano, traficante mexicano, irlandês corrupto...) e nunca sabemos de que negócio ele vive. É como se Charlie fosse uma personificação de um mal atemporal e impessoal.

É esse mal, no comentário de McDonagh, que Hollywood conjura com seus filmes cheios de homicidas coloridos, à moda Guy Ritchie. Sete Psicopatas e um Shih Tzu fica o tempo todo testando os limites desse mal - primeiro torturando a eterna Preciosa, Gabourey Sidibe, depois numa cena de execução brutal que o diretor filma, mui artisticamente, com um plano de câmera do sangue espirrado na parede. Quando um dos personagens diz que "Deus também enlouqueceu", McDonagh quer dizer que o papel do Criador exige uma responsabilidade, e os criadores de Hollywood nem sempre a levam em conta.

Sem se deixar levar demais pelo moralismo, Sete Psicopatas e um Shih Tzu faz considerações interessantes sobre racismo, catarse e, principalmente, sobre a geografia de Los Angeles. Fã assumido de David Lynch, McDonagh também enxerga, a exemplo do mestre de Estrada Perdida, o deserto em torno de Hollywood como uma espécie de zona negativa, uma terra de ninguém que ao mesmo tempo isola L.A. do mundo e permite que ali as projeções de Hollywood se manifestem cenicamente. (Estradas sem rumo também são importantes no melhor filme metalinguístico recente a tocar na fixação    de Hollywood com a morte, Caminho para o Nada, de Monte Hellman.)

Se Sete Psicopatas e um Shih Tzu no fundo parece muito mais uma pensata do que uma narrativa, é porque McDonagh não consegue, depois de desarmar todos os clichês que encontrou pela frente, definir um propósito para seu filme. No clímax, fica a impressão de que qualquer coisa pode acontecer (no mau sentido), porque estamos diante não de personagens, mas de marionetes, e nosso envolvimento com eles é próximo do zero. Essa é a principal armadilha da metalinguagem - e McDonagh não percebe que coisas velhas e desacreditadas como convenções, arquétipos e estereótipos às vezes são as melhores ferramentas de que um roteirista pode dispor.

Sete Psicopatas e um Shih Tzu | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Bom