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Crítica

Spiderhead é um bom drama de atuações (mal) disfarçado de blockbuster sci-fi

Joseph Kosinski faz filme tímido, mas com temas bem resolvidos

18.06.2022, às 22H44.

Não acredite no trabalho de marketing da Netflix: Spiderhead não é mais um filme-evento do streaming. Apesar dos três nomes estrelados do elenco (Chris Hemsworth, Miles Teller e Jurnee Smollett) e da atual badalação do diretor Joseph Kosinski por causa do sucesso de Top Gun: Maverick, este é um longa calculadamente pequeno - e até melhor, em alguns sentidos, por causa disso.

Gravado durante alguns dos meses mais intensos da pandemia da covid-19 na Austrália, quando o país da Oceania se tornou um porto-seguro para produções cinematográficas, Spiderhead carrega o ascetismo próprio das construções visuais de seu diretor, mas em uma escala tímida: os quatro ou cinco ambientes nos quais a trama se passa, todos parte de uma mesma locação (e, portanto, coerentes entre si) são bem desenhados, sofisticados… mas não particularmente engenhosos, expressivos ou emblemáticos das temáticas da história.

O protagonista aqui é Jeff (Teller), prisioneiro de Spiderhead, um misto de complexo penitenciário e laboratório de pesquisa. Por lá, detentos têm mais liberdade para ir e vir e mais conforto, mas também precisam se submeter a testes com produtos químicos diversos, que provocam alterações de consciência severas: um deles, por exemplo, é capaz de te fazer sentir medo mortal de qualquer objeto inócuo, enquanto outro provoca súbita paixão (e desejo sexual) por qualquer pessoa que estiver bem à sua frente.

No comando desses testes está o carismático cientista Steve Abnesti, papel que dá a Chris Hemsworth a rara oportunidade de se esticar para além do charme estúpido de suas atuações cômicas ou da nobreza estoica de seus heróis de ação. Aqui, o ator constrói um antagonista dinâmico e perigoso, cujos discursos de intimidação resvalam na paródia dos CEOs megalomaníacos da nossa realidade, mas cuja intensidade emocional o empurra para o campo do grotesco. Justamente por fazê-lo tão humano, machucado, múltiplo, Hemsworth torna Abnesti ainda mais assustador.

O brilho da performance é ainda mais evidente porque essa é a verdadeira identidade de Spiderhead como filme: ele é um drama de atuações, uma história sobre interações humanas e construída em interações humanas. O seu conceito de ficção científica não só é simples, como também de simples execução: coloque um grupo de atores competentes em um par de salas crivelmente decoradas para parecerem futuristas, e observe enquanto eles exploram algumas das emoções mais extremas da humanidade.

Em defesa de Kosinski, ele se mostra hábil ao manejar essa amplitude emocional. O seu uso da câmera nos diálogos entre os personagens é tão ou mais deliberado do que nas grandes sequências de ação de Top Gun ou nas explorações de cenários grandiosos que vimos em TRON: O Legado e Oblivion. De certa forma, ele até suplementa a inadequação de alguns trechos do texto, assinado por Paul Wernick e Rhett Reese (Deadpool), mais propenso a brincadeiras conceituais do que a dar o peso emocional correto a algumas das viradas de trama tiradas do conto de George Saunders.

Muito por causa do jogo de cintura de Kosinski, e do bom time de atores que ele reuniu, Spiderhead justifica-se como experiência narrativa e artística mesmo quando insiste em mastigar sua mensagem com uma narração em off intrusiva nos últimos minutos, por exemplo. Esta não é uma ficção científica particularmente profunda, mas tem ideias interessantes sobre a superioridade de uma vida levada em tranquila imperfeição diante da busca eterna, exaustiva, insustentável pela emoção impecável, fabricada, pura.

Como toda boa obra do gênero, Spiderhead é um testemunho de humanidade. É a sua pequenez emocional, e não prática, que a torna um filme por vezes frustrante.

Nota do Crítico
Bom