Estudiosos costumam dizer que a história é cíclica e que a humanidade eventualmente repete erros (e acertos) do passado. Assistir Suprema em 2019 é uma prova incontestável disso. Simbolicamente, a produção começa com um exércitos de homens (brancos, em sua maioria) caminhando altivamente para a escola de direito de Harvard. No meio deles está Ruth Bader Ginsburg (Felicity Jones), que anos após esse primeiro dia de aula mudaria para sempre a história das mulheres nos EUA e no mundo.
Dirigida por Mimi Leder (The Leftovers, Shameless), a produção faz um trabalho competente ao mostrar como o machismo e o preconceito fazem parte da vida das mulheres em pequenas atitudes. Ruth não é a única mulher em sua sala de aula e o reitor Griswold (Sam Warterston) convida a todas para um jantar especial. Mas o que poderia ser um momento de felicidade se torna praticamente uma humilhação, quando cada uma precisa dizer por que está lá. Nas palavras do próprio reitor, elas precisam “justificar” por que estão “tirando” a vaga de um homem que poderia estar ali. Com esta cena, Leder faz uma analogia clara de como mulheres precisam se provar o tempo inteiro.
Jones, indicada ao Oscar por A Teoria de Tudo, faz um belo trabalho ao interpretar Ruth em diferentes fases da vida. No começo ela é uma jovem cheia de energia para lutar por seus ideais, mas após apoiar seu marido doente e se formar com notas incríveis, ela tem dificuldades para encontrar emprego. O mercado de trabalho acha que mulheres são “emotivas” demais para serem advogadas e outros tratam a questão como cotas: se já há uma mulher no escritório, não precisam de outra. A decepção no olhar de Jones em cada derrota é tocante para qualquer um que já sentiu isso na pele. Ela sabe que é a melhor para o emprego e mesmo assim vê a porta ser fechada.
Mas além de ser certeiro ao retratar todas as dificuldades das mulheres, Suprema é, acima de tudo, um longa otimista sobre a questão. Isso é representado, por exemplo, por Jane Ginsburg (Cailee Spaeny), filha adolescente de Ruth e Martin. Criada para ser independente, a jovem é mostrada como um farol de esperança de que as novas gerações de mulheres podem pouco a pouco mudar velhas convenções. É ela, por exemplo, que confronta a própria mãe após sentir que ela entrou em uma zona de conforto por ter se tornado professora. É através das atitudes de Jane que Ruth toma coragem para aceitar um caso que muda a história dos EUA. Ao olhar para a filha, RBG entende que o mundo já mudou e que as leis daquele período é que estão ultrapassadas.
Por tudo isso, quando Suprema termina, o sentimento que fica é de uma profunda esperança por dias melhores. A direção é cuidadosa ao incluir a verdadeira Ruth Bader Ginsburg em uma cena tocante em que é impossível não se emocionar. Se a história é realmente cíclica e estamos fadados a repetir o passado, tomara que possamos também repetir os acertos para sermos, em nossas próprias realidades, um pouco como RBG.