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Não deve ser nada fácil ter um dos rostos mais bonitos e conhecidos do mundo. Por mais que a beleza ajude a abrir algumas portas, ela cobra um preço alto. Primeiro gera a desconfiança de que haja um talento verdadeiro ali. Depois pela própria necessidade de ficar sempre provando seus outros valores. É o que enfrenta hoje a talentosa e linda Charlize Theron. Ao ler na sinopse que Terra fria (North Country, 2005) é um filme sobre mulheres que trabalhavam em uma mina de carvão, fica difícil imaginar aqueles belos olhos azuis e pele alva se submetendo a tais serviços e ainda ouvindo desaforos dos colegas de trabalho.
Mas no papel de Josey Aimes, a sul-africana constrói uma personagem que sofre desde a adolescência nas mãos dos homens. Seu pai a incriminava pela gravidez precoce. Seu marido abusava do álcool e, logo depois, dela. Até seu filho tem lá as suas restrições. Quando encontra o mesmo cenário no ambiente de trabalho, ela segura as pontas por um tempo, até que a situação chega a um limite e ela decide dar um novo rumo à sua vida. Ela toma então a iniciativa de começar uma ação trabalhista contra os seus empregadores, o que só torna a situação mais difícil para ela e as demais mulheres que trabalhavam por lá.
Parte dos méritos e da merecida indicação ao Oscar de Melhor Atriz se deve justamente à construção dessa personagem. Theron dá veracidade à Josey quando mostra a importância que seus filhos têm em sua vida, a felicidade de conseguir sustentar a sua família com seu próprio suor. Ao seu lado, ela teve a companhia das não menos talentosas Sissy Spacek (interpretando sua mãe) e Frances McDormand (a amiga que a convida a ir trabalhar nas minas). No elenco masculino, vale destacar os trabalhos de Richard Jenkins (o pai) e Woody Harrelson (o advogado que vai defendê-la no tribunal).
Para reunir tantos talentos com o modesto orçamento que teve este filme (35 milhões de dólares), é necessário um roteiro forte e/ou um nome de peso na direção. Para o trabalho atrás das câmeras foi convidada a neo-zelandesa Niki Caro, do ótimo Encantadora de baleias (2004). Em sua estréia em Hollywood, ela consegue as já elogiadas atuações e conta de forma bastante segura sua história inspirada no livro Class Action: The Story of Lois Jenson and the Landmark Case That Changed Sexual Harassment Law, de Clara Bingham e Laura Leedy Gansler.
Porém, o roteiro acaba caindo no estilo Super Cine - baseado em fatos reais e dramalhão - e derrapa no seu final, um tanto quanto esperado. Não chega a ser um erro mortal. Na verdade, levando-se em consideração as imposições da terra do cinema, é possível rapidamente desculpá-la. Mas que sirva de aviso à cineasta: em Hollywood, para se conseguir fazer os filmes do jeito que ele foi imaginado, é preciso lutar e ter pulso firme, como mostrou Josey Aimes.