O cinema de nostalgia do diretor argentino Juan José Campanella aceita prontamente o futebol como tema, porque boa parte do mundo da bola vive do memorialismo - o velho terrão e a bola de meia versus o profissionalismo dos craques cosmopolitas e seus megaempresários - da mesma forma que filmes como O Filho da Noiva e Clube da Lua, respostas de Campanella à crise financeira que tirou da Argentina a ilusão da bonança dos tempos do menemismo.
um time show de bola
um time show de bola
No início da animação Um Time Show de Bola (Metegol), parece que estamos num bairro tradicional de Buenos Aires parecido com o de O Filho da Noiva, em um daqueles cafés antigos com janela de vitrais na porta. Lá dentro há uma mesa de pebolim (ou totó, ou fla-flu...), cujo campeão inconteste é o jovem introvertido Amadeo. Anos depois de derrotar no jogo o garoto mais metido da vizinhança, Amadeo vê o rival retornar à cidade, agora como um astro mundial do futebol de campo determinado a destruir o café e a mesa de pebolim e construir no lugar um gigantesco estádio para uso próprio.
Não deixa de ser irônico ver o longa de Campanella, com sua posição contrária à mercantilização, estrear no Brasil em meio às polêmicas de superfaturamento das obras da Copa do Mundo, mas de qualquer forma Um Time Show de Bola é o tipo de história atemporal como toda peça de nostalgia: numa equipe os mercenários e oportunistas, na outra os defensores de tradições (de família, de cultura).
Se Amadeo, seu rival e os demais personagens humanos são pobremente desenvolvidos, em parte é porque têm dificuldade de fugir desses papéis que lhes reservaram. (E desenhar personagens com olhos gigantes para forçar na emotividade é um cacoete de animação dos mais baratos.) A grande graça do filme são os jogadores do pebolim, que ganham vida para ajudar Amadeo em sua aventura. Esses, sim, têm personalidade, embora algumas das piadas façam mais sentido para os argentinos do que para os brasileiros, como a do atacante "Sansão" que perde seu grande trunfo, a cabeleira.
Para usar um chavão de boleiro, os personagens-jogadores mostram ter entrosamento suficiente para carregar o filme, e Campanella filma as cenas de ação com a mesma virtuose, em planos sem cortes, que ele havia mostrado justamente na cena de futebol de seu O Segredo dos Seus Olhos. No mais, há sempre um charme muito particular nessas animações de aventureiros em miniatura - de Toy Story a Pequenos Guerreiros - e Um Time Show de Bola se esforça para se filiar a essa linhagem. Só não precisava pesar tanto a mão nos olhos gigantes...